DOMINGO
DO TEMPO DA QUARESMA (Diácono Ismael)
Tema: “O tempo já se
completou e o Reino está próximo. Convertei-vos!”
Deus oferece uma nova vida;
Precisamos mudar o nosso rumo.
SINOPSE:
Primeira leitura: Através do dilúvio Deus faz nascer uma nova humanidade e faz com
ela
uma Aliança.
Evangelho: Jesus mostra que na renúncia ao egoísmo e na aceitação dos
projetos de Deus
está a origem do mundo novo que
Deus quer (o “Reino de Deus”).
Segunda leitura: Pedro nos lembra que pelo Batismo, os cristãos aderiram a Cristo
e com Ele
devemos seguir no caminho do amor, do
serviço e do dom da vida; o Reino está entre nós.
PRIMEIRA LEITURA (Gn 9,8-15) Leitura do livro do Gênesis.
Disse Deus a Noé e a seus
filhos: “Eis que vou estabelecer minha aliança convosco e com vossa
descendência, com todos os seres vivos que estão convosco... : nunca mais ...haverá mais dilúvio para devastar a terra”....: “Este é o sinal da aliança...: ponho meu arco nas nuvens...”.
AMBIENTE
- São lendas e mitos de outros povos. Os catequistas de Israel
tomaram esses mitos, adaptaram-nos, ao serviço da transmissão da sua própria
fé. A arqueologia dá conta de várias inundações catastróficas entre 4000 e 2800 a.C.. Não se tratou de
um dilúvio universal; mas, a fantasia popular teria feito dessas inundações um
“castigo universal”. O autor bíblico vai usá-las como catequese e transmitir
uma mensagem religiosa; Jahwéh não fica de braços cruzados quando os homens pecam,
ou os justos lhe invocam. Mas, porque Deus não castiga às cegas bons e maus, os
autores vão propor a história do justo Noé e da sua família, salvos por Deus da
catástrofe, abençoou Noé e a sua família (cf. Gn 9,1-7) e fez uma Aliança com
eles.
MENSAGEM
- A Aliança com Noé é diferente da Aliança feita com Abraão, ou da
Aliança no Sinai. Nas outras Alianças, um indivíduo ou um Povo aceitavam ou não
esse desafio; se não aceitassem, não haveria Aliança… A Aliança com Noé não
implica adesão, nem promessa, por parte do homem, de não voltar a pecar. A
Aliança com Noé é puro dom de Deus, um fruto do seu amor e da sua misericórdia.
O sinal desta Aliança será o arco-íris, o “arco de guerra”. Jogando com esta
duplicidade, o teólogo sugere que Jahwéh pendurou o seu “arco de guerra”, a fim
de demonstrar ao homem as suas intenções pacíficas.
ATUALIZAÇÃO • Os catequistas pegaram na velha lenda para ensinar que o pecado
é algo incompatível com os projetos de Deus; por isso, quando o ódio, a
violência, o egoísmo, o orgulho, a prepotência trazem infelicidade aos homens,
Deus tem de intervir para corrigir o rumo da humanidade. pecado destrói a vida
a felicidade do homem.
• A Aliança com Noé é uma Aliança gratuita e não depende do
arrependimento do homem. Esta Aliança revela um Deus que abençoa e abraça o
homem, mesmo quando ele continua a pecar e ser infiel. Deus nos ama apesar das
nossas infidelidades; e somos convidados a deixar que o amor de Deus nos
transforme e nos faça renascer para a vida nova.
SALMO RESPONSORIAL
/ Sl 24 (25)
Verdade e amor são
os caminhos do Senhor!
• Mostrai-me, ó Senhor, vossos caminhos / e fazei-me
conhecer a vossa estrada! / Vossa verdade me oriente e me conduza, / porque
sois o Deus da minha salvação.
• Recordai, Senhor meu Deus, vossa ternura / e a vossa
compaixão que são eternas! / De mim lembrai-vos, porque sois misericórdia / e
sois bondade sem limites, ó Senhor!
• O Senhor é piedade e retidão / e reconduz ao bom caminho
os pecadores. / Ele dirige os humildes na justiça / e aos pobres ele ensina o
seu caminho.
EVANGELHO (Mc 1,12-15). ... o Espírito levou Jesus para o deserto. E ele ficou no deserto
durante quarenta dias, e aí foi tentado por Satanás. Vivia entre os animais
selvagens, e os anjos o serviam. Depois que João Batista foi preso, Jesus foi
para a Galiléia, pregando o Evangelho de Deus e dizendo: “O tempo já se
completou e o Reino de Deus está próximo. Convertei-vos e crede no Evangelho!”
AMBIENTE - Marcos apresenta Jesus e
nos diz que Jesus é Aquele que vem “batizar no Espírito”, o Filho amado, sobre
quem o Pai derrama o Espírito e a quem envia em missão para o meio dos homens,
o Messias que enfrenta e vence o mal que oprime os homens, a fim de fazer
nascer um mundo novo.
MENSAGEM – A tentação de Jesus
trata-se de uma catequese. Está carregado de símbolos. O deserto é, o lugar do encontro com Deus; foi lugar
de uma Aliança. Deserto é também o lugar da “prova”, da “tentação”;
Israel sentiu, várias vezes, a tentação de escolher caminhos contrários aos
propostos por Deus… O “deserto” para onde Jesus “vai” é, o “lugar” do encontro
com Deus e do discernimento dos seus projetos; e é o “lugar” da prova, onde se
é confrontado com a tentação de abandonar Deus e de seguir outros caminhos.
Nesse “deserto”, Jesus ficou “quarenta
dias”. O número “quarenta” refere-se ao tempo da caminhada do Povo de
Israel pelo deserto; mas também é usado para significar “toda a vida” ou o
“tempo necessário”. Jesus foi “tentado por Satanás”. A palavra “satanás” designava, originalmente, o
adversário que apresentava a acusação (Sal 109,6). Mais tarde, passa a designar
uma personagem que integrava a corte celeste e que acusava o homem diante de
Deus (Jó 1,6-12). Na época de Jesus, “satanás” já não era considerado uma
personagem da corte celeste, mas um espírito mau, inimigo do homem, que
procurava destruir o homem e frustrar os planos de Deus. É neste sentido que
ele vai aparecer aqui… “Satanás” representa um personagem que vai tentar levar
Jesus a esquecer os planos de Deus e a fazer escolhas pessoais, que estejam em
contradição com os projetos do Pai.
É provável que Marcos estivesse pensando em tentações de poder e
de messianismo político. A tentação pretende, portanto, induzir Jesus a
enveredar por um caminho de poder, de autoridade, de violência, de messianismo
político, frustrando os projetos de Deus que passavam por um messianismo
marcado pelo amor incondicional, pelo serviço simples e humilde, pelo dom da
vida.
A referência às “feras”
que rodeavam Jesus e aos “anjos”:
Alguns “mestres” de Israel ensinavam que Adão, o primeiro homem, vivia no
paraíso em paz completa com todos os animais e que os anjos estavam à sua volta
para o servir; mas, quando Adão escolheu o caminho da autossuficiência e se
revoltou contra Deus, rompeu-se a harmonia original, os animais tornaram-se
inimigos do homem e até os anjos deixaram de o servir. A catequese dos “rabis”
adiantava que, quando o Messias chegasse, nasceria um mundo harmonioso, sem
violência e sem conflito, onde até os animais ferozes viveriam em paz com o
homem. Seria o regresso à harmonia original, ao plano original de Deus para os
homens e para o mundo. É isso que Marcos está aqui sugerindo: com Jesus, chegou
esse tempo messiânico de paz sem fim, chegou o tempo de regressar a essa
harmonia que era o plano inicial de Deus. É também um paralelo entre Adão e
Jesus: Adão cedeu à tentação de escolher caminhos contrários aos de Deus e
criou inimizade, violência, conflito, escravidão, sofrimento; Jesus escolheu
viver na mais completa fidelidade aos projetos de Deus e fez nascer um mundo
novo, de harmonia, de paz, de amor, de felicidade sem fim.
Em síntese: Jesus confrontou-Se com duas propostas de vida: ou
viver na fidelidade aos projetos do Pai, fazendo da sua vida uma entrega de
amor, ou enveredando por um caminho messiânico de poder, de violência, de
autoridade, ao jeito dos grandes deste mundo. Jesus escolheu viver na
obediência às propostas do Pai; da sua opção, vai surgir um mundo de paz e de
harmonia, um mundo novo que reproduz o plano original de Deus.
Na segunda parte, Marcos transporta-nos para a Galileia, onde
Jesus aparece a concretizar esse plano salvador do Pai que, na cena anterior,
Ele escolheu cumprir. Jesus anuncia que “chegou o tempo”, o “tempo” do “Reino de Deus”. A catequese referia-se a Jahwéh como a um rei que governa
o seu Povo. Os reis terrenos eram homens escolhidos e ungidos por Jahwéh para
governar o Povo, em lugar do verdadeiro rei que era Deus. O exemplo mais típico
de um rei/servo de Jahwéh foi David. A saudade deste rei ideal e do tempo ideal
de paz e de felicidade em
que Jahwéh reinava (através de David) vai marcar toda a
história futura de Israel. Nas épocas de crise, o Povo sonhava com o regresso
aos tempos gloriosos de David. Os profetas vão alimentar a esperança anunciando
a chegada de um tempo, no futuro, em que Jahwéh vai voltar a reinar sobre Israel e vai
restabelecer a situação ideal da época de David. Essa missão será confiada a um
“ungido” que Deus vai enviar ao seu Povo. Esse “ungido” estabelecerá, então, um
tempo de paz, de justiça, de abundância, de felicidade sem fim – isto é, o
tempo do “reinado de Deus”.
O “Reino de Deus” é, portanto, uma noção que resume a esperança de
Israel num mundo novo, de paz e de abundância, preparado por Deus para o seu
Povo. Esta esperança está bem viva no coração de Israel e Jesus então diz: “cumpriu-se o tempo e está
próximo o reino de Deus”. Jesus começa a construção desse “Reino” pedindo a
conversão (“metanóia”) e o acolhimento da Boa Nova (“evangelho”).
“Converter-se” significa transformar a mentalidade e os
comportamentos, assumir uma nova atitude de base, reformular os valores que
orientam a própria vida, de modo a que Deus passe a estar no centro da
existência do homem. Para Jesus, não é possível que esse mundo novo sem que o
homem renuncie ao egoísmo, ao orgulho, à autossuficiência e passe a escutar, de
novo, Deus e as suas propostas.
“Acreditar” é aderir à pessoa de Jesus, escutar a sua proposta,
acolhê-la no coração, fazer dela o guia da própria vida. “Acreditar” é escutar
essa “Boa Notícia” de salvação e de libertação (“evangelho”) que Jesus propõe e
fazer dela o centro à volta do qual se constrói toda a existência. “Conversão” e “adesão ao projeto de
Jesus” são duas faces de uma mesma moeda: a construção de um homem novo, com
uma nova mentalidade, com novos valores. Então, teremos um mundo novo – o
“Reino de Deus”.
ATUALIZAÇÃO • Jesus foi confrontado
com opções. Ele teve de escolher entre viver na fidelidade aos projetos do Pai
ou enveredar por um caminho de egoísmo, de poder, de autossuficiência. Jesus
escolheu viver na obediência às propostas do Pai. Os discípulos de Jesus são
confrontados com as mesmas opções. Seguir Jesus é perceber os projetos de Deus
e cumpri-los fielmente, fazendo da própria vida uma entrega de amor e um
serviço aos irmãos.
• Ao dispor-se a cumprir o projeto do Pai, Jesus começou a
construir um mundo novo, de harmonia, de justiça, de reconciliação, de amor e
de paz. A esse mundo novo, Jesus chamava “Reino de Deus”.
• O “Reino de Deus” exige a “conversão”. “Converter-se” é, antes
de mais, renunciar a caminhos de egoísmo e de autossuficiência e centrar a
própria vida em Deus, de forma a que Deus e os seus projetos sejam sempre a
nossa prioridade máxima. Implica modificar a nossa mentalidade, os nossos
valores, as nossas atitudes, a nossa forma de encarar Deus, o mundo e os
outros. Exige que sejamos capazes de renunciar ao egoísmo, ao orgulho, à
autossuficiência, ao comodismo e que voltemos a escutar Deus e as suas
propostas.
• O “Reino de Deus” exige, também, o “acreditar” no Evangelho.
“Acreditar” é aderir à pessoa de Jesus e ao seu projeto de vida. Jesus propôs
aos homens uma vida de amor total, de doação, de serviço simples e humilde, de
perdão sem limites. O “discípulo” é alguém que está disposto a escutar Jesus e segui-lo
no caminho do amor e do dom da vida.
• Todos os batizados são chamados a “converter-se”, a “acreditar
no Evangelho”, a seguir Jesus nesse caminho de amor e de dom da vida. Esse
chamamento exige que o “Reino” se torne o valor fundamental.
• O “Reino” é uma realidade que Jesus começou e que já está na
nossa história. Através dos gestos de bondade, de serviço, de doação, de amor
gratuito que acontecem à nossa volta são um sinal visível do amor de Deus nas
nossas vidas. Não é uma realidade que construímos de uma vez, mas é uma
realidade sempre em
construção. Em cada dia que passa, temos de renovar o
compromisso com o “Reino” e empenharmo-nos na sua edificação.
SEGUNDA LEITURA (1Pd 3,18-22) Carta de São Pedro:
Cristo morreu... por causa dos pecados... a fim de nos conduzir a Deus.
Sofreu a morte, ...mas recebeu nova vida pelo Espírito. No Espírito, ele foi também
pregar ...aos que foram desobedientes antigamente, ...nos dias em que Noé construía a arca. Nesta
arca, umas poucas pessoas - oito - foram salvas por meio da água. À
arca corresponde o batismo, que hoje é a vossa salvação. Pois o batismo
não serve para limpar o corpo da imundície, mas é um pedido a Deus para
obter uma boa consciência, em virtude da ressurreição de Jesus Cristo. Ele
subiu ao céu e está à direita de Deus, submetendo-se a ele anjos, dominações e
potestades.
AMBIENTE - O autor é um cristão que
conhece a situação das comunidades da Ásia Menor. Ele escreve em finais do séc.
I (nunca antes dos anos 80). Exorta a manterem-se fiéis à sua fé, apesar das
dificuldades. Convida-os a olharem para Cristo, que passou pela paixão e cruz,
antes de chegar à ressurreição; e exorta-os a manterem a esperança, o amor, a
solidariedade, vivendo com alegria e fidelidade a sua opção cristã.
MENSAGEM - Cristo, partilhou as
nossas dores e limitações, a fim de realizar o projeto de salvação que o Pai
tinha para os homens. Ele que era justo e bom aceitou morrer para conduzir
todos os homens ao encontro da vida verdadeira, da felicidade plena. A sua
morte não foi um fracasso, pois foi vivificado pelo Espírito para a glória. A
morte e a ressurreição de Cristo atingiu toda a humanidade, mesmo essa
humanidade pecadora que conheceu o dilúvio, no tempo de Noé. No dilúvio, o
pecado foi afogado e da água ressurgiu uma nova humanidade. A água do dilúvio é
uma figura do Batismo. Pelo Batismo, os crentes aderiram a Cristo e à salvação
que Ele veio oferecer, comprometeram-se a segui-lO nessa vida de amor, de dom,
de entrega, , tornaram-se o princípio de uma nova humanidade. Na água do
Batismo, os crentes nasceram para a vida do bem, da justiça e da verdade.
A conclusão: se Cristo propiciou, mesmo aos injustos, a salvação,
também os cristãos devem dar a vida e fazer o bem, mesmo quando são perseguidos
e sofrem. Comprometidos com Cristo pelo Batismo, eles nasceram para uma vida
nova; e devem testemunhar essa vida nova diante de todos os homens, mesmo
diante dos maus e dos perseguidores.
ATUALIZAÇÃO • Mais uma vez, o
problema do sentido de uma vida feita dom e entrega aos outros, até à morte.
Reparemos no exemplo de Cristo: Ele deu a vida pelos pecadores e pelos injustos
e encontrou, no final do caminho, a ressurreição, a vida plena.
• Diante das dificuldades, das propostas contrárias aos valores
cristãos, é em Cristo que colocamos a nossa confiança e a nossa esperança? Ou é
noutros esquemas materiais, imediatos, mais lógicos?
• Diante dos ataques, como nos comportamos? Com a mesma
agressividade com que nos tratam? Tratando-os com a lógica do “olho por olho,
dente por dente”? Como é que Jesus tratou aqueles que O condenaram e mataram?
Pe. Manuel Barbosa, Pe. Carvalho, Pe. Joaquim
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A descida de Cristo aos infernos é um dogma de fé que está no credo. Cristo
desceu para liberar os justos que o tinham precedido.
Jesus, tendo poder não se ajudou, pois quis ser em tudo igual aos homens (Fl
2,7) e, como vemos hoje, com exceção do pecado (Hb 4, 15), que é sucumbir à
tentação.
As tentações de Jesus eram para desviá-lo de sua missão messiânica..
O anjo serve Jesus, porque Ele é superior
aos anjos.
O evangelho, além da fé, exige no homem um desejo de modificar sua
conduta segundo a Boa Nova.
O exemplo de Cristo como aquele que veio
servir e não ser servido (Mt 20,28) nos transforma em escravos desse novo
esquema de vida, o Reino (Mc 9,35
). Assim de escravos do pecado (Jo
8,34) nos transformamos em escravos do Bem, através do serviço ao próximo.. Mas
o Cristo os transforma de servos em filhos (Jo 1,12) e ele mesmo, Jesus, quis
chamá-los de amigos (Jo 15,15).
Nessa conversão, ao admitir Deus como Pai e os homens como superiores,
está a base ética do evangelho. É necessário que aceitemos também a base
teológica que é a fé. Por isso Jesus acrescenta: Crede no evangelho. Isto
é, escravos não por temor ou por amor ao lucro, mas porque estamos convencidos
de que o serviço é a melhor maneira de atender ao apelo de Deus e às
necessidades do próximo.
Uma grande miséria dos cristãos destes tempos é terem perdido a
consciência que somos um povo sagrado, vivendo entre os outros povos do mundo.
A Quaresma é um tempo de deserto, de provação, de combate espiritual contra
Satanás, o Pai da mentira, o enganador da humanidade. Sem combate não há
vitória e não há vida cristã de verdade! A Igreja, dá-nos as armas para o
combate:
a oração, a penitência e a esmola.
O importante é que ninguém fique indiferente a misericórdia
que o Senhor nos concede!
Diz Santo
Agostinho
que, ninguém se conhece a si mesmo sem ser experimentado, e não pode ser
coroado sem ter vencido, e não pode vencer, se não tiver combatido e não pode
lutar se não encontrou o inimigo e as tentações.
Satanás promete sempre mais do que
pode dar. A felicidade está muito longe das suas mãos. Toda a tentação é sempre
um engano! O diabo conta com as nossas ambições.. Muitas vezes, o pior dos
ídolos é o nosso próprio eu. Temos que vigiar, em luta constante, porque dentro
de nós permanece a tendência de desejar a glória humana. Jesus também se dirige
a nós quando diz: “Adorarás o Senhor teu Deus e só a Ele servirás”. E é isto o
que nós desejamos e pedimos: servir a Deus alicerçados na vocação a que Ele nos
chamou.
O Senhor está sempre ao nosso lado, em cada tentação, e nos diz
afetuosamente: “Confiai: Eu venci o mundo” (Jo16, 33). E com o salmista podemos
dizer: “O Senhor é a minha luz e a minha salvação; a quem temerei?” (Sl 26, 1).
“Procuremos fugir das ocasiões de pecado, pois aquele que ama o perigo nele
perecerá” (Eclo 3, 27). Jesus nos ensinou: “Não nos deixeis cair em tentação”.
Na Quaresma somos todos chamados ao deserto, para um confronto conosco mesmos,
com Deus e com o próximo e os bens materiais. Somos chamados a despojar-nos de
nós mesmos para nos revestir de Deus.
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Q1201: No Deserto
Estamos no início da
QUARESMA.
Quaresma é o grande
retiro espiritual dos cristãos em preparação da festa da Páscoa.
É o coração do ano
litúrgico e o cume da fé cristã.
Na Igreja Primitiva,
na Quaresma fazia-se a preparação próxima do Batismo.
As Leituras nos
introduzem no caminho da renovação do Batismo e nos chamam à conversão.
A 1a
Leitura evoca o
Dilúvio, o 1° BATISMO pelo qual todo o Universo teve de passar para que surgisse
uma nova
criação. (Gn 9,8-15)
Começamos a ler a
Historia da salvação a partir do episódio do Dilúvio, quando Deus salvou o
justo Noé e sua família e fez a primeira Aliança com a humanidade.
Através do dilúvio,
Deus purificou a humanidade corrompida.
O Dilúvio foi o
grande batismo de todo o Universo, que renasceu das águas para estabelecer uma
nova Aliança.
E o arco-íris
deixado por Deus no céu foi o sinal dessa Aliança, desse abraço entre o céu e a
terra, entre Deus e os homens.
A 2a
Leitura, nos lembra que as águas purificadoras do Dilúvio são imagem
das águas purificadoras do Batismo. (1Pd
3,18-22)
* Pedro interpreta a
figura de Noé e do Dilúvio em chave batismal.
É uma antiga catequese Batismal da Igreja
primitiva.
O Evangelho
resume as palavras inaugurais do ministério de Jesus, proclamando a graça do
reino e chamando os homens à conversão. (Mc
1,12-15)
O episódio das TENTAÇÕES de Jesus no DESERTO, mais do que
uma narrativa histórica, trata-se de uma Catequese.
- "O deserto", para os
judeus, é o lugar privilegiado do encontro com Deus.
Foi no deserto que o Povo experimentou o amor e a solicitude
de Deus e foi no deserto que Deus propôs a Israel uma Aliança.
Foi também no deserto, que Israel tentou Deus: Valia a pena
o êxodo: Não seria melhor permanecer no Egito ao redor das panelas de carne e
cebolas.
- Para Jesus o "deserto" é o
"lugar" do encontro com Deus e do discernimento dos seus projetos. E
é o "lugar" da prova, da tentação de abandonar Deus e de seguir
outros caminhos.
- "Quarenta dias" é um
número simbólico, que lembra o tempo da caminhada do Povo no deserto e a
experiência de Moisés e de Elias.
- "Satanás" representa os que se opõem ao
estabelecimento do seu Reino.
- "As
tentações": Marcos não especifica as tentações, mas elas simbolizam
as provações que Jesus enfrentou ao longo de toda a sua vida para se manter
fiel à missão confiada por Deus.
Elas resumem também
as tentações de todos nós...
A vida de Jesus será
uma luta constante de superação até a vitória definitiva na cruz, através da
Ressurreição.
Da sua opção, vai surgir um mundo de paz e de harmonia.
Jesus aparece como o novo Adão, que vence o tentador.
Vencendo a tentação, Jesus inaugura a Aliança definitiva,
mais importante que a de Noé.
Após ser Batizado e
ter superado as Tentações no DESERTO, Jesus inicia o seu trabalho
apostólico, proclamando:
"O Reino já chegou... Convertei-vos e
crede no evangelho".
As mesmas palavras,
que ouvimos quarta feira passada ao receber as cinzas e que são um resumo do
espírito da Quaresma, que estamos iniciando.
* QUARESMA é DILÚVIO e DESERTO.
- É Dilúvio
que arranca o pecado e leva a construir a área de Salvação e é Sinal de que Deus está em Paz conosco.
- É Deserto
pela espiritualidade do despojamento, que nos propõe.
* QUARESMA é CONVERTER-SE e CRER:
- "Converter-se"
é muito mais que fazer penitências ou realizar privações momentâneas.
É fazer com Deus seja o centro de nossa
existência e ocupe sempre o primeiro lugar.
- "Crer"
não é apenas aceitar um conjunto de verdades intelectuais.
É aderir à pessoa de Cristo, escutar a sua
proposta, acolhê-la no coração e fazer dela o guia de nossa vida.
A nossa Quaresma:
A Liturgia de hoje nos conscientiza da fidelidade de Deus e
da necessidade de morrer ao homem velho
para ressuscitar com Cristo a uma vida nova.
Sinal eficaz desse passo é o Batismo; o caminho é a
conversão até a Páscoa.
Gesto concreto:
O que pretendo fazer
nesse tempo sagrado da Quaresma?
Planejei gestos
concretos:
- Quais são os momentos especiais de Oração...
de Deserto?
- Qual a minha Penitência quaresmal,
proveitosa para mim e agradável a Deus?
- Quais os atos de Caridade que
pretendo realizar?
- O que poderia fazer para promover a minha saúde
e de todos os irmãos, para que "a
saúde se difunda sobre a terra".
Esse é o caminho
para que a Páscoa aconteça dentro de cada um de nós...
Pe.
Antônio Geraldo
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Homilia
do PE. PEDRINHO
Irmãos e irmãs, a Quaresma tem como
propósito de reflexão, mais que palavras, precisamos entender significados, o símbolo dessas palavras. Nós temos
vários personagens apresentados no texto bíblico, tanto no antigo como no Novo
Testamento. São personagens que estabelecem alianças com Deus. Cada um, a seu
modo, estabelece sua Aliança. Hoje, nós temos aqui relatado, a Aliança que Deus
propõe a Noé. É evidente que São Pedro nos dará a liberdade, para afirmar desde
o início, que a Arca de Noé é simbólica.
O Próprio Pedro vai dizer que o dilúvio era um pré-anúncio, um anúncio
antecipado, do Batismo. Portanto, nós não vamos entender o dilúvio como algo
historicamente acontecido. Ah, mais então não aconteceu? Isto para nós não é
importante. Para quem tem fé, não é importante
se aconteceu ou se não aconteceu. O importante é que mensagem eu posso tirar desse relato, disso que está sendo contado.
E a mensagem é muito tranquila; Deus
controla tudo, inclusive as águas. Ele é que controla quando começa e
quando termina de chover. Ele é que decide quando se deve entrar na arca e
quando se deve sair. São Pedro nos diz que oito pessoas puderam estabelecer
esta aliança junto com Noé. Oito é um número simbólico. Noé e mais sete. Noé
coordenando a perfeição que vem de Deus. Sete
é um número muito simbólico muito grande, que significa a plenitude. Então,
todos os que ouviram, ouvem a Palavra de Deus, por mais turbulenta que possa
ser a vida, não se apavore, porque Deus é o Senhor e Ele conduz, estabiliza, protege, ele ajuda e defende a vida das
pessoas. Nós temos outros personagens na bíblia, que nos ajuda a entender as
atitudes de Jesus. Veja que Jesus vai
para o deserto e ali fica quarenta dias jejuando. É muito
interessante que também são quarenta dias de dilúvio. Portanto, é também um
número simbólico, para dizer O TEMPO NECESSÁRIO para que de fato Ele pudesse
iniciar a sua missão. E a missão de Jesus está, de certa maneira, muito ligada
a missão de João Batista; João Batista é alguém que procurou preparar o caminho
do Senhor e no momento em que Jesus fica
sabendo que João Batista foi preso, Ele compreende que ali começa a sua missão
que ele veio realizar. Ao enfrentar Satanás , são Marcos vai nos ajudando e nos
ensinando, que a vinda de Jesus é para
expulsar Satanás da vida das pessoas. Ora, por que Satanás aparece nos
mesmo textos que são falados de aliança? Porque
aliança é de fato um pacto entre duas partes; no nosso caso, de um lado
Deus e de outro Noé. Mas você tem também a aliança do matrimônio, aliança
estabelecida entre duas partes; o esposo e a esposa. Qual é o pacto
estabelecido aí? A fidelidade. Deus estabelece nunca mais abandonar o ser
humano e o ser humano, porque este é o pacto, a servir somente ao único e
verdadeiro Deus. E aí diz Deus: para
lembrar tudo isto terá o Arco Iris, sinal desta aliança. Toda a aliança terá sempre um sinal.
Por isso, os casais trazem a aliança; é o anel que por ser o sinal do pacto,
acabou também de ser chamado de aliança. Ora, o que é Satanás? Satanás é aquele que rompe a aliança. É
aquele que colabora para que uma das partes não seja fiel. Satanás é uma
proposta contrária a proposta de Deus. Então, de um lado você tem Satanás, e de
outro lado você tem o Paráclito. Paraclito é o Defensor. Dentro de um
julgamento você tem o defensor e o advogado de acusação, que é o promotor. O Promotor procura mostrar que a pessoa é
culpada e o advogado defensor procura mostrar que a pessoa é inocente. Quem é o
nosso grande defensor? Deus. Por isso nós o chamamos de Paráclito. Quem é o
nosso grande acusador? Satanás. E porque eu digo que ele é o acusador? Em
primeiro porque é isto que entendemos em toda a teologia. Em segundo, porque Deus não precisa nos testar para saber
até onde nós conseguimos ir. Se Ele precisar nos testar, Ele de fato não é
Deus, porque Deus conhece tudo. Quem é
que não conhece tudo? Satanás. Ele é que nos vai por a prova, para ver até onde
eu resisto. É muito interessante isto. Porque muitas vezes, nós atribuímos a
Deus aquilo que Satanás faz. Eu nunca ouvi alguém dizer; porque Satanás está me
tentando? Mas sempre: por que Deus está
me provando? Olha aí! Deus não prova,
mas se coloca ao lado para defender, para animar as pessoas a serem fiéis. Este
jogo, estas duas forças, de um lado os anjos e de outro satanás, vão estar
presentes na vida de Jesus, para dizer que todos nós somos tentados, mas temos
Deus a nosso serviço, entendido nesse sentido, de que Ele está ali para nos
amparar sempre. Então, meus irmãos e irmãs, diante desta realidade toda
simbólica, todos nós temos uma pergunta a fazer; Jesus anunciou que o tempo estava próximo e começou a sua missão. E eu?
Quais são os sinais que me levam a levar a minha missão em bom termo? A
realizar algo? E aí cada um tem a sua história para contar. Se ainda eu não me dei conta de que tenho
uma missão a realizar, este é um tempo de CONVERSÃO. “Convertei-vos e crede
no Evangelho”, disse Jesus. Se eu já me
dei conta que tenho uma missão a realizar, este
é o tempo de confirmar esta Aliança com Deus. Sabendo que Satanás pode me
por a prova, mas “se Deus é por nós, quem será contra nós”. É por isso então, que concluo a reflexão; são
Pedro vai nos dizer que a arca
corresponde ao batismo, que hoje é a vossa salvação. Ora, o Batismo é a nossa
grande Aliança, grande pacto realizado entre Deus e nós; Deus nos terá sempre
como filho e nós temos sempre a Deus como Pai. Que nesta caminhada,
possamos experimentar toda esta grandeza de Deus e que também tenhamos coragem
para enfrentar as tentações que aparecem a todo aquele que quer servir a Deus e
aos irmãos.
Louvado seja Nosso Senhor Jesus Cristo.
PE.
PEDRINHO
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Homilia
de D. Henrique Soares
Chegaram, para nós, os sagrados dias da Quaresma: dias de oração,
penitência, esmola, combate aos vícios e leitura espiritual. Esses dias tão
intensos nos preparam para as alegrias da Santa Páscoa do Senhor. Estejamos
atentos, pois não celebrará bem a Páscoa da Ressurreição quem não combater bem
nos dias roxos da Quaresma.
A Palavra que o Senhor nos dirige já neste Primeiro Domingo é uma séria
advertência neste sentido. A leitura do Gênesis nos mostrou como Deus é cheio
de boas intenções e bons sentimentos em relação a nós: depois de haver lavado
todo pecado da terra pelo dilúvio, misericordiosamente, o Senhor nosso Deus fez
aliança com toda a humanidade e com todas as criaturas: “Eis que vou
estabelecer minha aliança convosco e com todos os seres vivos! Nunca mais
criatura alguma será exterminada pelas águas do dilúvio.” E, de modo poético,
comovente, o Senhor colocou no céu o seu arco, o arco-íris, como sinal de paz,
de ponte que liga a criatura ao Criador: “Ponho meu arco nas nuvens, como sinal
de aliança entre mim e a terra!” Com esta imagem tão sugestiva, a Escritura
Sagrada nos diz que os pensamentos do Senhor em relação a nós são de paz e
salvação. Podemos rezar como o Salmista: “Mostrai-me, ó Senhor, vossos
caminhos; sois o Deus da minha salvação! Recordai, Senhor, meu Deus, vossa
ternura e a vossa salvação, que são eternas! O Senhor é piedade e retidão, e
reconduz ao bom caminho os pecadores!”
Ora, caríssimos, se já a aliança após o dilúvio revelava a benignidade do
coração de Deus, é em Cristo que tal bondade, tal misericórdia, tal compaixão
se nos revelam totalmente: “Cristo morreu, uma vez por todas, por causa dos
pecados, o justo pelos injustos, a fim de nos conduzir a Deus!” Não é este
Mistério tão grande que vamos celebrar na Santa Páscoa? Nosso Senhor, morto na
sua natureza humana, isto é, morto na carne, foi justificado, ressuscitado pelo
Pai no Espírito Santo para nos dar a salvação definitiva, selando conosco a
aliança eterna, da qual aquela de Noé era apenas uma prefiguração. Deus nos
salvou em Cristo, dando-nos o seu Espírito Santo, recebido por nós nas águas do
Batismo, que purificam mais que aquelas outras, do dilúvio! Nunca esqueçamos:
fomos lavados, purificados, gerados de novo, no santo Batismo. Somos membros do
povo da aliança nova e eterna, somos uma humanidade nova, nascida “não da
vontade do sangue, nem da vontade da carne, nem da vontade do homem, mas de
Deus” (Jo 1,12). Somos o povo santo de Deus, povo resgatado pelo sangue de
Cristo, povo que vive no Espírito Santo que o Ressuscitado derramou sobre nós.
Uma grande miséria dos cristãos destes tempos nossos é terem perdido a
consciência que somos um povo sagrado, vivendo entre os outros povos do mundo.
Brasileiros, argentinos, mexicanos, estadunidenses, europeus, asiáticos,
africanos… não importa: aqueles que crêem em Cristo e nele foram batizados, são
a sua Igreja, são o povo santo de Deus, congregado no Corpo do Senhor Jesus,
para formar um só templo santo no Espírito de Cristo! Somos um povo que vive
entre os pagãos, um povo que vive espalhado por toda a terra, Igreja dispersa
pelo mundo inteiro, que deve viver no mundo sem ser do mundo! A miséria nossa é
querermos ser como todo mundo, viver como todo mundo, pensar e agir como todo
mundo. Isso é trair a nossa vocação de povo sagrado, povo sacerdotal, povo que
deve, com a vida e a boca cantar as maravilhas daquele que nos chamou das
trevas para a sua luz admirável! (cf. 2Pd 2,9) Convertamo-nos! Sejamos dignos
da nossa vocação!
Eis o tempo da Quaresma! Somos convidados nestes dias a retomar a
consciência de ser este povo santo. E como fazê-lo? Como Jesus, o Santo de
Deus, que passou quarenta dias no deserto em combate espiritual, sendo tentado
por Satanás. A Quaresma é um tempo de deserto, de provação, de combate
espiritual contra Satanás, o Pai da mentira, o enganador da humanidade. Sem
combate não há vitória e não há vida cristã de verdade! A Igreja, dá-nos as
armas para o combate: a oração, a penitência e a esmola. A Igreja nos pede
neste tempo, que combatamos nossos vícios com mais atenção e empenho; a Igreja
nos recomenda a leitura da Sagrada Escritura e de livros edificantes, que unjam
o nosso coração. Deixemos a preguiça, cuidemos do combate espiritual! Que cada
um programe o que fazer a mais de oração. Há tantas possibilidades: rezar um
salmo todos os dias, rezar todo o saltério ao longo da Quaresma, rezar a
via-sacra às quartas e sextas-feiras. Quanto à penitência, não enganemos o
Senhor! Que cada um tire generosamente algo da comida durante todos os dias da
Quaresma (exceto aos domingos); que se abstenha da carne às sextas-feiras, como
sempre pediu a tradição ascética da Igreja, que tire também algo das conversas
inúteis, dos pensamentos levianos, dos programas de TV tão nocivos à saúde da
alma! E a esmola, isto é, a caridade fraterna? Há tanto que se pode fazer:
acolher melhor quem bate à nossa porta, aproximar-nos de quem necessita de
nossa ajuda, reconciliarmo-nos com aqueles de quem nos afastamos, visitar os
doentes e presos… No Brasil, a Igreja procura também dá um tema e uma direção
comunitária à caridade fraterna, com a Campanha da Fraternidade. Assim, os
Bispos pedem que, neste ano, nossa caridade comunitária esteja atenta ao
problema da segurança pública e sua causas. Que nós estejamos mais atentos aos
problemas ligados à segurança, recordando sempre que a paz verdadeira e
duradoura é fruto da justiça: justiça como obediência ao Senhor Deus e justiça
como reto comportamento em relação ao próximo, que significa respeito pela
dignidade do outro, espírito de partilha e de solidariedade que socorre nas
necessidades. Quanto ao combate dos vícios, que cada um veja um vício dominante
e cuida de combatê-lo com afinco nesses dias! Escolha também uma leitura
espiritual para o tempo quaresmal, leitura que alimente a mente e o coração.
Esta leitura, mais que um estudo, deve ser uma oração, um refrigério para o
coração, uma leitura edificante, que nos faça tomar mais gosto pelas coisas de
Deus… Vamos! Deixemos a preguiça, combatamos o combate da nossa salvação!
Finalmente, que ninguém esqueça a confissão sacramental, para celebrar
dignamente a Páscoa sagrada. Se alguém não puder se confessar por se encontrar
em situação irregular perante Cristo e a Igreja, que não se sinta excluído!
Procure o sacerdote para uma direção espiritual, uma revisão de vida e peça uma
bênção, que, certamente, não lhe será negada. Não é a confissão, não permite o
acesso à comunhão sacramental, mas é também um modo medicinal de aliviar o
coração e ajudar no caminho do Senhor!
O importante, caríssimos, em Cristo, é que ninguém fique indiferente a mais
essa oportunidade que a misericórdia do Senhor nos concede! Notem que somente
depois do combate no deserto é que Jesus nosso Senhor saiu para anunciar a Boa
Nova do Reino. Também cada um de nós e a Igreja como um todo, somente poderá
testemunhar o Reino que Cristo nos trouxe se tiver a coragem de enfrentar o
deserto interior e combater o combate da fé! Não recebamos em vão a graça de
Deus! Que ele, na sua imensa misericórdia, nos conceda uma santa Quaresma!
Amém.
D. Henrique Soares
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Fé e penitência
“Fazei penitência e crede no Evangelho” (Mc 1,15). Essas palavras do Senhor
mostram a conexão necessária entre a fé e a conversão, entre ser cristão e a
mudança de vida à qual ele nos chama. O cristianismo é uma realidade que
transforma todo o nosso ser, também a nossa maneira de pensar e de agir, a
realidade cristã “nos faz a cabeça e o coração”.
“Já não vos é permitido trazer aquela velha túnica, digo, não esta túnica
visível, mas o homem velho corrompido pelas concupiscências falazes. Oxalá a
alma, uma vez despojada dele, jamais torne a vesti-lo” (São Cirilo de
Jerusalém, Segunda Catequese Mistagógica sobre o Batismo, 2). Quem se aproxima
de Deus se transforma numa criatura nova, pois assim como não é possível
aproximar-se do sol sem se queimar ou entrar na água sem se molhar, tampouco é
possível aproximar-se de Deus sem se transformar.
Nesta quaresma, temos “um tempo propício para renovarmos, com a ajuda da
Palavra de Deus e dos Sacramentos, o nosso caminho pessoal e comunitário de fé”
(Bento XVI, Mensagem para a Quaresma de 2012). Mas não pensemos em grandes
façanhas, já que as verdadeiras batalhas se travam no dia-a-dia e nas pequenas
coisas da nossa existência. Deixar de beber refrigerante durante a Quaresma é
bom, melhor ainda seria deixar a aspereza e a falta de educação; não comer
carne durante esses dias é algo louvável, mais excelente ainda é viver o pudor
e a modéstia no vestir; não comer chocolate durante esse tempo de penitência é
algo excelente, contanto que nos ajude a vencer a gula, especialmente a
voracidade; não ver televisão durante a quaresma é excelente, mais excelente
ainda se abandonássemos de uma vez por todas essas novelas que ferem
constantemente a dignidade humana e a nobreza cristã.
Alguém poderia me dizer que o ótimo pode ser inimigo do bom. De acordo! Por
isso eu não desvalorizei em momento algum as coisas boas. No entanto, resisto
não ter em conta aquelas belas palavras do nosso queridíssimo Bento XVI: “Os
mestres espirituais lembram que, na vida de fé, quem não avança, recua.
Queridos irmãos e irmãs, acolhamos o convite, sempre atual, para tendermos à
«medida alta da vida cristã» (João Paulo II, Carta ap. Novo millenio ineunte,
31). A Igreja, na sua sabedoria, ao reconhecer e proclamar a bem-aventurança e
a santidade de alguns cristãos exemplares, tem como finalidade também suscitar
o desejo de imitar as suas virtudes. São Paulo exorta: «Adiantai-vos uns aos
outros na mútua estima» (Rm 12, 10)”.
Essa “medida alta da vida cristã” começa com uma vida de fé, na qual se
insere necessariamente a mudança de mentalidade e de costumes daqueles que
aderiram à Palavra de Deus e aos Sacramentos. Um dos aspectos da virtude
sobrenatural da fé é o abandono em Deus, a confiança no Senhor, de tal maneira
que ele passa a ser o nosso apoio, a nossa rocha; nele depositamos todo o nosso
existir. No fundo o crescimento na vida espiritual será um crescimento no
abandono em Deus, no diálogo com Deus e na entrega amorosa a ele e aos irmãos
por amor a ele.
Aproveitemos o convite que a liturgia da Igreja nos dirige neste primeiro
domingo da Quaresma para examinarmo-nos sobre aquelas coisas que ainda nos
afastam de Deus e dos nossos irmãos, que nos impedem de crescer na fé e no
espírito de penitência, que nos atrasam no caminho do amor.
Pe. Françoá Costa
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As Tentações de Jesus!
O 1º Domingo da Quaresma nos apresenta todos os anos o mistério do jejum de
Jesus no deserto, seguido das tentações (cf. Mc 1 ,12-15).
Quaresma é para nós um tempo forte de conversão e renovação em preparação à
Páscoa. É tempo de rasgar o coração e voltar ao Senhor. Tempo de retomar o
caminho e de se abrir à graça do Senhor, que nos ama e nos socorre. É um tempo
sagrado para aprofundar o Plano de Deus e rever a nossa vida cristã. E nós
somos convidados pelo Espírito ao DESERTO da Quaresma para nos fortalecer nas
TENTAÇÕES, que freqüentemente tentam nos afastar dos planos de Deus.
A Quaresma comemora os quarenta dias que Jesus passou no deserto, como
preparação para esses anos de pregação que culminam na CRUZ e na glória da
Páscoa. Quarenta dias de oração e de penitência que, ao findarem, desembocam na
cena que Marcos narra no cap. 1 ,12-15. É uma cena cheia de mistério, que o
homem em vão pretende entender – Deus que se submete à tentação, que deixa agir
o Maligno –, mas que pode ser meditada se pedirmos ao Senhor que nos faça
compreender a lição que encerra.
É a primeira vez que o demônio intervém na vida de Jesus, e faz isto
abertamente. Põe à prova Nosso Senhor; talvez queira averiguar se chegou a hora
do Messias. Jesus deixa-o agir para nos dar exemplo de humildade e para nos
ensinar – diz São João Crisóstomo –, quis também ser conduzido ao deserto e ali
travar combate com o demônio a fim de que os batizados, se depois do batismo
sofrem maiores tentações, não se assustem com isso, como se fosse algo de
inesperado. Se não contássemos com as tentações que temos de sofrer, abriríamos
a porta a um grande inimigo: o desalento e a tristeza.
A narrativa das tentações que Jesus sofreu mostra que Jesus “foi
experimentado em tudo” (Hb 4, 15), comprovando também a veracidade da
Encarnação do Verbo de Deus.
Diz Santo Agostinho que, na sua passagem por este mundo nossa vida não pode
escapar à prova da tentação, dado que nosso progresso se realiza pela prova. De
fato, ninguém se conhece a si mesmo sem ser experimentado, e não pode ser
coroado sem ter vencido, e não pode vencer, se não tiver combatido e não pode
lutar se não encontrou o inimigo e as tentações.
Por isso, a existência do ser humano nesta terra é uma batalha contínua
contra o mal. É esta luta contra o pecado, a exemplo de Cristo, que devemos
intensificar nesta Quaresma; luta que constitui uma tarefa para a vida toda.
O demônio promete sempre mais do que pode dar. A felicidade está muito longe
das suas mãos. Toda a tentação é sempre um engano miserável! Mas, para nos
experimentar, o demônio conta com as nossas ambições. E a pior delas é desejar
a todo o custo a glória pessoal; a ânsia de nos procurarmos sistematicamente a
nós mesmos nas coisas que fazemos e projetamos. Muitas vezes, o pior dos ídolos
é o nosso próprio eu. Temos que vigiar, em luta constante, porque dentro de nós
permanece a tendência de desejar a glória humana, apesar de termos dito ao
Senhor que não queremos outra glória que não a dEle. Jesus também se dirige a
nós quando diz: “Adorarás o Senhor teu Deus e só a Ele servirás”. E é isto o
que nós desejamos e pedimos: servir a Deus alicerçados na vocação a que Ele nos
chamou.
O Senhor está sempre ao nosso lado, em cada tentação, e nos diz
afetuosamente: “Confiai: Eu venci o mundo” (Jo16, 33). E com o salmista podemos
dizer: “O Senhor é a minha luz e a minha salvação; a quem temerei?” (Sl 26, 1).
“Procuremos fugir das ocasiões de pecado, por pequenas que sejam, pois aquele
que ama o perigo nele perecerá” (Eclo 3, 27). Como Jesus nos ensinou na oração
do Pai Nosso: “Não nos deixeis cair em tentação”; é necessário repetir muitas
vezes e com confiança essa oração!
Contamos sempre com a graça de Deus para vencer qualquer tentação. Usemos as
armas para vencermos na batalha espiritual, que são: a oração contínua, a
sinceridade com o diretor espiritual, a Eucaristia, o sacramento da Confissão
(Penitência), um generoso espírito de mortificação cristã, a humildade de
coração e uma devoção terna e filial a Nossa Senhora.
Na Quaresma somos todos chamados ao deserto, para um confronto conosco
mesmos, com Deus e com o próximo e os bens materiais. Somos chamados a
despojar-nos de nós mesmos para nos revestir de Deus.
Durante a Quaresma a Igreja, no Brasil, celebra a Campanha da Fraternidade,
com o tema: Fraternidade e Saúde Pública, e o lema: “Que a saúde se difunda
sobre a terra” (Eclo 38,8)! Como discípulos missionários de Jesus Cristo, todos
os cristãos católicos são convocados a promover a vida. Difundir a saúde é
cuidar para que todos tenham vida, e a tenham em plenitude.
O cuidado com a saúde é uma exigência fundamental na vida. Zelar pela saúde
não é apenas combater as doenças mas principalmente evitá-las. A saúde é dom de
Deus, mas é também conquista humana. O zelo pela saúde é responsabilidade de
cada pessoa e dever do Estado. A Igreja, através da Pastoral da Saúde, busca
ser a voz sensibilizadora e denunciadora do descaso de muitas autoridades e
órgãos governamentais onde conta o ter e o poder, onde a saúde é vista como
mercadoria e as pessoas doentes com um peso para o Estado.
Por isso, é nossa missão amar, defender e proteger a vida desde a concepção
até o seu declínio natural.
Boa Quaresma para todos!
“Que a saúde se difunda sobre a terra”!
Mons. José Maria Pereira
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Mc 1,
12-15 - LOUVOR (QUANDO O PÃO CONSAGRADO ESTIVER SOBRE O ALTAR)
- O
SENHOR ESTEJA COM TODOS VOCÊS...
DEMOS GRAÇAS AO SENHOR, O NOSSO DEUS...
- POR
CRISTO, COM CRISTO E EM CRISTO, NA FORÇA DO ESPÍRITO SANTO, LOUVEMOS AO PAI:
Todos : Senhor, grande é vosso amor; salvai-nos!
- Senhor, nosso Deus e Pai, vossa bondade se estende de geração a
geração. Nós vemos vosso arco no céu, sinal de vossa aliança para conosco; Sois
Deus de bondade infinita.
T: Senhor, grande é vosso amor; salvai-nos!
- Senhor, nosso Deus e Pai, bendito seja o vosso nome sobre todo o
universo. Sois o nosso Deus e somos vosso povo que nos conduzis pela mão.
T: Senhor, grande é vosso amor; salvai-nos!
- Senhor, nosso Deus e Pai, enviai-nos o Espírito Santo para que
saibamos compreender os vossos projetos de vida E saibamos amar e fazer o bem a
todos.
T: Senhor, grande é vosso amor; salvai-nos!
- Senhor, nosso Deus e Pai, que saibamos vencer o nosso egoísmo e
prepotência para podermos ser pessoas de paz de justiça e amor.
T: Senhor, grande é vosso amor; salvai-nos!
- Senhor, nosso Deus e Pai, que saibamos seguir os passos de vosso
Filho Jesus Cristo no amor, na doação e no serviço humilde para com o nosso
próximo.
T: Senhor, grande é vosso amor; salvai-nos!
- Senhor, nosso Deus e Pai, abençoai-nos para que saibamos cumprir
a vossa vontade aqui na terra, para que o Vosso Reino venha a nós.
T: Senhor, grande é vosso amor; salvai-nos! Pai
nosso, Paz, Cordeiro...
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EPÍSTOLA (1 Pd 3, 18-22)
VISITA AOS INFERNOS:. No nosso caso, é o cárcere que os judeus
chamavam de sheol, pois era um lugar sem luz como eram as prisões antigas. No
sheol, lugar de trevas era onde estavam as almas de todos os defuntos, bons e
maus, após a sua morte. Posteriormente, os rabinos distinguiam entre o sheol
dos condenados sem esperança de redenção, e o outro sheol, dos justos que
esperavam a redenção e que era chamado de seio de Abraão, ou limbo (Lc 16, 22).
Seria a esta parte do sheol que Jesus foi após a morte, pois não entrou no céu
antes de sua ascensão. Ao dizer EM ESPÍRITO significa que ainda não tinha
ressuscitado, ou seja, antes do domingo, no intervalo da sexta, dia de sua
morte, até o domingo, dia de sua ressurreição. Segundo um exegeta moderno,
aqueles que foram desobedientes se arrependeram no momento do dilúvio e, antes
de morrer, pediram perdão, como se a água do dilúvio fosse um batismo de
penitência, obtendo na morte a expiação dos seus pecados. Por isso o apóstolo
compara o dilúvio com o batismo, sendo aquele antítipo deste último (v. 21).
O BATISMO: Se a água salvou os desobedientes nos tempos de Noé, agora
-dirá Pedro- nos salva; pois a água do dilúvio foi um antítipo, REPRESENTAÇÃO
do batismo. De fato, serve como figura, cópia ou duplicado, como vemos em Hb 9,
24: Cristo não entrou num santuário feito por mãos, figura do verdadeiro, porém
no mesmo céu, para agora comparecer por nós perante a face de Deus. Através da
água foram salvas oito pessoas e agora somos salvos não por uma lavagem
material, ou como diz o texto para REMOÇÃO DA SUJEIRA, mas como figura de boa
consciência. Com isto o apóstolo quer significar que o batismo nos limpa a
consciência pelo desejo sincero a Deus dirigido por meio da ressurreição de
Jesus Cristo. Que significa? Que o batismo é uma limpeza de consciência, ou
seja, perdão absoluto. De cujo fato é um aval a ressurreição de Jesus Cristo.
TRIUNFO DE CRISTO: O qual está à direita de (o) Deus tendo ido ao
céu, estando sujeitos a ele anjos e potestades e poderes. Com esta frase, Pedro
declara que o reinado de Cristo é universal, pois a ele estão sujeitos não
unicamente os homens, mas os poderes angélicos e as POTESTADES. Mas neste caso,
parece indicar as forças cósmicas que sustêm o Universo, como em Mc 13, 25: E
as estrelas cairão do céu, e as forças que estão nos céus serão abaladas (ver
Lc 21, 26). Foi, pois, exaltado sobre toda criatura que era superior ao simples
homem. Na descida aos infernos ou lugar dos mortos, Cristo adquire uma
autoridade que está acima de todo poder, e que se manifestará no fim, como dirá
Paulo, quando tiver entregado o reino a Deus, ao Pai, e quando houver
aniquilado todo o império, e toda a potestade e força (1 Cor 15, 24).
EXCURSUS A descida de Cristo aos infernos é um dogma de fé que está
no símbolo da mesma que chamamos de credo [desceu à região dos mortos], e que
foi declarado como tal dogma no Concilio Lateranense IV. Cristo teria descido
no tríduo anterior a sua ressurreição àquela parte do Sheol que chama de
cárcere [fylakë] onde se encontravam os justos do AT e que em tempos de Jesus
era chamado de seio de Abraão (Lc 16, 22-23). Nele, que foi chamado de limbo
pelos padres da Igreja primitiva, encontravam-se também os contemporâneos de
Noé, arrependidos pela catástrofe do Dilúvio, opinião de S. Roberto Belarmino,
que foi adotada pelos teólogos católicos. Também Paulo fala desta descida em Ef
4,9: Ora, isto -ele subiu- que é, senão que também antes tinha descido às
partes mais baixas da terra? O Sheol que em grego se traduz por Hades e a
Vulgata por Infernus (Ap 1, 18) era a morada dos mortos, privados da visão
de Deus. E são precisamente estas almas, que esperavam o seu Libertador no seio
de Abraão, as que Cristo liberou quando desceu aos infernos (Catecismo Romano).
De modo que não desceu para liberar os condenados, nem destruir o que nós
chamamos hoje de inferno dos mesmos, mas para liberar os justos que o tinham
precedido. Em parte temos esta libertação confirmada em Mt 27:52: E abriram-se
os sepulcros, e muitos corpos de santos que dormiam foram ressuscitados. Como
afirma S. João, para que os mortos ouçam a voz do Filho de Deus, e os que a
ouvirem viverão (5, 25). De modo que em Hb 2, 14-15 lemos: Para que pela morte
aniquilasse o que tinha o império da morte, isto é, o diabo; e livrasse todos
os que, com medo da morte, estavam por toda a vida sujeitos à servidão . Daí
em diante Ele pode
afirmar: Eu tenho poder sobre a morte e sobre o mundo dos mortos (Ap 1, 18). De
todos estes textos temos a certeza de que não desceu para intimar
aos proscritos mas para anunciar aos justos a Boa Nova de sua libertação.
EVANGELHO (Mc 1, 12-15)
TENTAÇÕES DE
JESUS E INÍCIO DE SEU MINISTÉRIO (paralelos Mt 4, 1-11 e Lc 4, 1-1)
INTRODUÇÃO: O evangelho de hoje é dividido em duas partes: As
tentações de Jesus e o início de sua evangelização. É um tanto estranho esta
narração das tentações de Jesus, visto que, aparentemente, nada aportam à sua
mensagem evangélica. Porém, nada disso é verdadeiro. Em primeiro lugar devemos
considerar que se Jesus, o Mestre e Fundador, foi tentado pelo diabo em pessoa,
todos os seus seguidores fiéis podem, e, de fato, são tentados, quando iniciam
uma vida de entrega aos planos divinos para a salvação dos homens. Nos
evangelhos de Mateus e Lucas temos ainda outros motivos para que estas
tentações sejam motivos de uma lição magistral: A pergunta dos fariseus se
torna pergunta dos fiéis na sua vida: como, tendo em suas mãos o poder divino,
só o usou para curar as doenças de terceiros e aplacar fomes alheias? Como é
possível que, podendo com um sinal estupendo reduzir oposições e vencer
dificuldades, e podendo pedir mais de doze legiões de anjos (Mt 26, 53), não o
fez na sua vida e não o faz na vida de sua Igreja? A resposta está
em que Ele quis ser em tudo
igual aos homens (Fl 2,7) e, como vemos hoje, com exceção do pecado (Hb 4, 15),
que é sucumbir à tentação. A segunda parte unida a esta do deserto por um
depois, ou uma vez que [meta de], é um artifício literário que expressa de
forma simbólica o repentino surgir de Jesus como anunciador da Boa Nova, que
constitui a segunda página do evangelho de hoje.
O IMPULSO DO ESPÍRITO: E o Espírito [to Pneûma] o expulsa para dentro
do deserto. Marcos não dá opção ao tempo transcorrido entre o batismo de Jesus
por João e seu retiro no deserto. A ação deste último é imediata ao batismo.
Todos os três evangelistas têm como principal autor desse retiro o Espírito,
que, provindo de Deus preenchia o ser de Jesus, segundo Lucas (4,1). Este
Espírito expele Jesus para dentro do deserto. O verbo ekballö significa lançar
fora, banir, expulsar, expelir, fazer sair.. Os outros evangelistas usam verbos
que indicam um impulso irresistível por parte de Deus, chamado aqui de Espírito
Santo, Sagrado ou Divino. Mateus fala de conduzir a um lugar alto e Lucas, em
passiva, descreve como Jesus era levado pelo Espírito. O imperfeito de Lucas
indica uma ação contínua. Significa que, de agora em diante, Jesus estará
dominado pela ação interna do poder e sabedoria de Deus, que suplantará as
funções puramente humanas de sua natureza. O verbo usado por Marcos [ekballö]
indica a separação que Jesus iria experimentar fora do círculo comum em contato
com os outros seres humanos. Daí o deserto, que não deve entender-se como um
lugar de areia ao modo do deserto do Saara, mas um lugar inóspito, desabitado,
sem contato com homens, mas unicamente com animais, com o anjo tentador ou
Satanás, e finalmente com os anjos. O DESERTO: a) DESERTO REAL: A palavra grega
Érêmos significa lugar desabitado, solitário. É estranho que João
batizasse no Jordão, pregando no deserto de Judeia, situado este a mais de
20 Km de distância do
rio. Certamente o lugar onde João batizava não poderia ser chamado de
deserto de Judeia. Consequentemente, Mateus não pode ser tomado como referência
geográfica para os sucessos do batismo de Jesus e sua retirada ao deserto. Onde
estava, pois, este deserto no qual encontramos feras [thêrion], impossíveis de
serem achadas no deserto da Judeia? Muito mais confiança oferece João que situa
Betabara como o lugar
em que
Jesus foi batizado, ao norte, em território da Decápolis e
perto da Galileia. Perto de Betabara encontramos lugares desertos como era a
morada habitual do endemoninhado geraseno, que segundo Lucas era impelido pelo
demônio para os lugares desertos (Lc 8, 29). É assim mesmo como o pastor,
buscando a perdida deixa no deserto as noventa e nove (Lc 11, 4). Tudo isso
indica que o deserto não é um nome restritivo a um determinado lugar, ou nome
próprio, mas nome comum, determinado por sua solidão e ausência de habitantes.
Logicamente podemos afirmar que o deserto ao qual Jesus se retirou estava muito
mais próximo da Galileia do que da Judeia, que o deserto das tentações era os
montes do que antigamente chamava-se de Gileade, [escabroso] e que ao norte do
mesmo estava Basã, de cuja região era famosos os touros, ao parecer selvagens
(Sl 22, 13), ou vacas que moravam nas montanhas (Am 4, 1). Uma confirmação de
que não era o deserto da Judeia podemos vislumbrar em João 3, 22: Depois disso
Jesus veio para o território da Judeia. Pois muitos consideram a purificação do
templo e o encontro com Nicodemos uma interpolação entre 2, 12 e 3, 22. b)
BÍBLICO: O deserto era terra medonha e terrível não abençoada por Deus, em que
o povo se encontrava como enterrado na terra (Êx 14, 3) Na linguagem bíblica, a
aridez do deserto é símbolo de uma terra à qual Deus nega sua bênção e,
portanto, privada de chuva e fertilidade. Neste sentido é comparado com a
cidade que foi objeto do castigo divino (Lc 13, 35). Historicamente, Israel
viveu no deserto 40 anos. A solidão do povo com Jahvé transformou a vida de
extrema penúria, em época privilegiada,
em que Israel nasceria
como povo e teria como único guia o Senhor Jahvé (Êx 13, 21-22). Foi o lugar da
purificação e experimentação da pobreza (Dt 8, 2-5) do povo para que
aprendesse que não só de pão vive o homem (Dt 8,2-5). O deserto é sinal de
salvação (Is 35,1-10) e dali, pois, devia vir o Messias (Mt 24,26). Os profetas
anunciavam as promessas do reino, dizendo que o deserto se transformaria em
jardim, onde as feras seriam inofensivas (Is 32,15-17).
OS 40 DIAS: E permanecia ali no deserto quarenta dias (13): A Vulgata
traduz também e quarenta noites, sem dúvida, devido a um copista que sabia das
afirmações dos outros dois sinóticos. Como Marcos não fala do jejum, por isso
não tem como falar das noites que distinguiriam um jejum parcial de um jejum
total. O NÚMERO 40: A pergunta, que sempre é feita, recai sobre se os 40 é um
número real, matemático, ou uma expressão simbólica que se refere a um número
grande de dias. Sabendo-se que os semitas não têm adjetivos indeterminados como
muitos, poucos, alguns, bastante, eles usam numerais: dois ou três, sete,
quarenta e até nomes como multidão para expressar conceitos indefinidos. Os 40
dias estarão dentro deste modo de falar? Porque esse número parece ser mais
simbólico que matemático, pois foi o número de dias e noites de chuva do
dilúvio, o número de anos antes de tomar esposas Jacob e Esaú, o número de dias
que tardaram em embalsamar os egípcios o corpo de José, quarenta anos os que os
israelitas permaneceram no deserto, 40 anos os que Israel viveu em paz durante
o mandato de seus principais juízes, ou os que os filisteus dominaram Israel.
Os anos que Davi reinou
em
todo Israel, e Salomão. São 40 dias as visões temerosas do
segundo livro dos Macabeus e 40 dias o tempo fixado para a destruição de
Nínive. Por isso, muitos dizem que esse número é mais simbólico que real.
Pode ser, mas não se descarta que o numeral seja correto do ponto de vista
matemático. Dir-se-á que é impossível viver sem água durante esse período, abstinência
que o jejum completo requeria do penitente. Mas se negamos o sobrenatural
porque a natureza exige sua intervenção, estaremos negando o poder do Espírito
que impele Jesus e teremos que negar muitas de suas obras consideradas
extraordinárias por seus conterrâneos. Em Marcos nada vemos do jejum de Jesus
que aparece como motivo da primeira tentação nos outros dois sinóticos. Vejamos
alguns casos modernos aos quais se dá o nome de inédia [ausência de alimento e
bebida]: Marta Robin (+1981) esteve 50 anos sem dormir, sem comer, nem
beber nada com a exceção da hóstia da comunhão que recebia semanalmente por
estar sua casa fora da aldeia onde morava. Teresa Newman (+1962) esteve 35 anos
sem comer nem beber; e, apesar de ter sangrado efusivamente durante a paixão e
perder
4 Kg,
o último dia os tinha recuperado totalmente. Outros exemplos: Ángela de
Foligno (+1309) 12 anos; Catarina de Siena (+1380) 8 anos; Catarina de Gênova
(+1510) 23 anos. Luisa Lateau (+1883) 13 anos. O fenômeno é próprio dos
místicos católicos. Não podemos duvidar, portanto, dos QUARENTA DIAS: Os
evangelistas falam de quarenta dias, à semelhança do tempo
em que Moisés
permaneceu no alto do Horeb diante de Deus para receber as tábuas da lei (Dt
9,9). Foi o tempo que Elias andou até o mesmo monte sem comer (I Rs 19, 8).
Esse foi o tempo que Jesus necessitou para contemplar e preparar seu anúncio do
Reino e a nova lei que substituiria a antiga de Moisés. Temos, pois, os
exemplos de Moisés e Elias, em que só a palavra de Deus os sustentava por meio
da fé e da oração. Desta última, Jesus fez uso em diversas situações,
separando-se para isso da comum convivência com discípulos e povo (Mc 1,35), e
especialmente na oração do horto de Getsêmani (Mc 14, 38-40).
A TENTAÇÃO: Sendo tentado por Satanás. No grego o
significado varia desde intentar até provar, testar, experimentar; uma das
acepções é incitar ao mal, solicitar. Propriamente deveríamos traduzir para ser
provado por Satanás. É o mesmo sujeito que experimentou a virtude de Jó no AT.
Unicamente varia no nosso caso o julgamento que o evangelista faz do personagem
em questão. No
caso de Jó era um dos anjos da corte divina [um dos Filhos de deus, beni
haelohim] (Jó 1,6), não contrário à vontade de Deus mas tomando a iniciativa
de, em nome do mesmo, experimentar a retidão do santo patriarca. Peirazö é o
verbo usado para experimentar se uma pessoa merece confiança. Os fariseus
experimentaram Jesus em várias ocasiões (Mt 19, 3). O próprio Jesus
experimentou o comportamento de seus discípulos ante o problema de como
alimentar a multidão que o seguia num lugar inóspito. É nesse sentido de
experimentar que poderia ser o comportamento de Jesus, como Filho de Deus, que
o tentador o experimenta em situações limites. Num sentido pejorativo a
tentação é por à prova a fé, a virtude ou o caráter de uma pessoa para
solicitá-la ao pecado. É neste sentido SATANÁS: É a transcrição da
palavra Shatãn [adversário] que a Setenta traduz por diábolos, com o
significado de caluniador ou
acusador. Em hebraico também pronunciado Shaitan
e cuja personificação grega é Typhon. O nome de diábolos aparece pela primeira
vez em 1 Cr 21, 1. E é o nome que o livro da Sabedoria usa para afirmar: Pela
inveja do diabo a morte entrou no mundo e a experimentam os que lhe pertencem
(Sb 2, 1). Os outros nomes que aparecem nas escrituras, ou nas tradições
judaicas como demônios, são Abaddon [destruidor] (Ap 9, 11), Asmodeu [demônio
da sensualidade e luxúria (Tb 3, 8), originalmente criatura do julgamento],
Apollyon [grego por Satã], Azazel [instruiu os homens a criarem armas] (Lv 16,
8), Belzebu [deus das moscas, cujo símbolo é o escaravelho] (Mt 10, 25),
Behemoth [personificação de Satanás cujo símbolo é o elefante], Lilith [demônio
feminino, primeira mulher de Adão]. Mas não são estes os tentadores de Jesus,
pois os demônios eram os causadores de doenças cuja origem era desconhecida. Já
Satanás é o príncipe das trevas, a antiga serpente, o inimigo frontal que Paulo
chama de Belial [ganâncias de corrupção] (2 Cor 6, 15). Também Moisés foi
tentado pelo povo, e em três ocasiões ele perdeu a compostura: Quando do
bezerro de ouro, quebrou as tábuas da lei (Dt 9, 17). Diante das murmurações do
povo sobre a comida, ele levou a coisa a mal e desejou a morte (Dt 1, 10-15).
Finalmente, ele se irritou e bateu na rocha duas vezes, e por isso foi impedido
de entrar na terra prometida (Nm 20, 11-12)
Já as tentações de Jesus eram
para desviá-lo de sua missão messiânica. E feitas pelo inimigo dos planos
divinos desde o início.
AS FERAS: Vivia entre os animais selvagens e os anjos o
serviam (13 c). Thêrion não significa necessariamente besta feroz. O
sinônimo, Zoe, significa um animal vivente em cujo significado também pode
entrar o homem. Já o Thêrion exclui todo ser humano. É o que Marcos quer
transmitir: que Jesus não teve contato com homens, mas com diabos [melhor, o
chefe satanás] e com anjos. A frase indica que, durante esse tempo, Jesus não
viu homem algum. Uma prova de que o Reino estava a se cumprir: Então o lobo
morará com o cordeiro e o leopardo se deitará com o cabrito. O bezerro, o
leãozinho e o gordo novilho andarão juntos e um menino pequeno os guiará (Is
11,6) em que inimigos dentro da ordem da natureza se entendem, sem serem mais
perigosos para o homem. E OS ANJOS O SERVIAM: Elias foi servido pelos corvos
segundo 1 Rs 17, 4: beberás da torrente; eu dei ordens aos corvos para que te
alimentem ali. No caso de Agar o anjo não a alimentou, mas abriu os olhos
da mulher que enxergou um poço (Gn 21, 19).
O anjo, superior ao homem, serve
Jesus, porque Ele é superior aos anjos. Com isso temos a primeira prova da
divindade de Jesus. O autor da epístola aos hebreus dirá que ao introduzir o
filho primogênito no mundo [Deus] diz novamente: prostrem-se diante dele todos
os anjos de Deus (Hb 1,6).
Marcos fala, pois, dos anjos como
servidores. Mateus também diz: Então o diabo o deixa e os anjos vieram e o
serviam (Mt 4, 11). Já Lucas evita os anjos e afirma que o diabo se retirou até
nova oportunidade [kairós]. Deste evangelho de Lucas temos prova segura da
existência dos anjos, não como mensageiros, mas como seres superiores a modo do
diabo, mas em sentido bom. Não se pode crer no diabo e duvidar da existência
dos anjos bons.
JOÃO É TRAÍDO: Após João ter sido traído. Originalmente,
significa entregar nas mãos de outro; mas esta entrega se entende que é uma
traição ou uma delação, quando o entregado é um homem. Exemplos no mesmo
Marcos: Um de vós me entregará [me trairá] (14, 18) e Estai de sobreaviso
porque vos entregarão aos tribunais e às sinagogas (13, 9). Usa-se também
quando é um objeto, ou um costume, ou uma fé: Invalidais a palavra de Deus pela
vossa tradição que vós mesmos transmitistes (7, 13). Paredóthe indica uma
traição embora não saibamos de quem. O mesmo verbo é usado por Mateus (4, 12)
para indicar o início da pregação de Jesus. A Vulgata traduz: traditus
est e as versões vernáculas ter sido preso.
A GALILEIA: Veio Jesus para a Galileia (14 b). Isso pode
indicar que Jesus estava na Judeia, como parece sugerir o quarto evangelista,
onde os discípulos de Jesus batizavam (Jo 3, 22 e 4, 2). Temendo provavelmente
a perseguição dos fariseus –que seria a causa da traição/entrega de João-
deixou a Judeia e retornou à Galileia (Jo 4, 1 e 3). Era uma região com mistura
de raças e religiões que recebia o depreciativo nome de terra de gentios ou das
nações (Mt 4, 15).
O ANÚNCIO DO REINO: Proclamando o evangelho do Reino do
(sic) Deus [tou Theou]. (
15 a).
O kêrisson significa uma proclamação pública. Evangelho; O significado inicial
é recompensa por boas notícias, ou sacrifício feito em ação de graças pelas
mesmas, passando a ser essas boas notícias. Biblicamente, no NT, após o início
de Marcos: Princípio do evangelho de Jesus Cristo, Filho de Deus (Mc 1, 1),
está sempre unido a uma proclamação do Reino de Deus, como podemos ler no
evangelho de hoje. Unindo os dois textos principais de Marcos que acabamos de
citar, podemos afirmar que o Reino de Deus tem como rei e figura senhorial
absoluta, Jesus, que é o Ungido e representante como Filho de Deus na terra. O
evangelho é o anúncio de Jesus e de uma nova era
em que Deus nos mostra sua
face humana em Jesus de Nazaré, a quem por sua morte Deus o ressuscitou e
constituiu como Senhor [kyrios] e Cristo [ungido ou Messias], esse mesmo que
foi crucificado (At 2, 36). Este é o evangelho que os discípulos deviam
transmitir e que sempre estaria atuante e presente através dos séculos porque
Ele vive e é Senhor. Por que procurais entre os mortos Aquele que vive? Dirá o
anjo às mulheres (Lc 24, 5). E em Ap 4, 9 o último livro do NT, lemos: os
quatro seres vivos adoram Aquele que vive pelos séculos dos séculos. Esse
Aquele a quem Paulo chama Senhor Jesus (Ef 1, 15) e que O fez sentar-se à sua
direita muito acima de qualquer Principado e Autoridade e Poder e
Soberania (Ef 1, 20-21). A proclamação do Reino se transformou no anúncio do
Senhor Jesus. E para isso é necessário estabelecer como base da proclamação a
Ressurreição de Jesus. Pois se Cristo não ressuscitou é inútil nossa fé (1 Cor
15, 17).
O EVANGELHO: Convertei-vos e crede no evangelho (15 b).
Qual era a mensagem [boa notícia] de Jesus durante os anos de sua atividade
pública na Palestina, para proclamar como o Batista uma conversão? Na verdade,
temos descrições de quem pode entrar no Reino, de como se desenvolve, das
circunstâncias do mesmo, de como se espalha, das dificuldades de entrar, mas
não sabemos em que consiste o Reino. Quando Pedro é louvado por sua fé em Jesus
ele é a rocha sobre a qual edificará a sua Igreja (Mt 16, 18), significando que
o Reino na terra é a Igreja visível que tem Pedro como fundamento, que Paulo
estende aos outros apóstolos e profetas (Ef 2, 20). Pedro tem as chaves desse
Reino além de ser o fundamento do mesmo. Quem entra no Reino do ponto de vista
humano? Em que consiste a conversão necessária? Podemos dizer que a
entrada no Reino é aberta pela disposição de aceitar a vontade de Deus
como suprema, e daí a supremacia também de Jesus, como ele dirá: Quem ama seu
pai ou sua mãe mais do que a mim, não é digno de mim (Mt 10, 37). O Pai Nosso quer
que o Reino se amplie na terra onde a vontade de Deus se torne norma como assim
é nos céus, domínio este último que o inimigo, o diabo, não pode debelar, por
ter sido definitivamente expulso do alto. Em termos divinos diremos que a
justiça se torna misericórdia e perdão para todos os homens que a seu domínio
querem se submeter. Deus é precisamente soberano, ao exercer a sua misericórdia
– como diz Maria – de geração em geração para aqueles que o temem (Lc 1, 50).
Que o servem poderíamos interpretar. Hoje, esta misericórdia é a nota que a
Igreja proclama como atributo essencial do Reino ao afirmar que Deus charitas
est [Deus é amor]. CONVERTEI-VOS: Temos visto, no parágrafo anterior, a parte
divina do Reino. Vejamos agora o papel do homem na mesma.
O evangelho, além da
fé, exige no homem um desejo de modificar sua conduta segundo as novidades que
lhe são apresentadas pela Boa Nova.
O exemplo de Cristo como
aquele que veio servir e não ser servido (Mt 20,28) nos transforma a todos em
escravos, se queremos ter alguma importância dentro desse novo esquema de vida,
o Reino (Mc 9,35
). Assim de escravos do pecado (Jo 8,34) nos
transformamos em escravos do Bem, através do serviço ao próximo. Quem não
entende isso, não sabe grande coisa do evangelho. Os antigos chamavam a si mesmos
escravos do Senhor, desde Davi (1 Sm 23,10) até Simeão (Lc 2,29). Mas o Cristo
os transforma de servos em filhos (Jo 1,12) e ele mesmo, Jesus, quis chamá-los
de amigos (Jo 15,15). Porém ainda somos servos uns dos outros (Mc 9,35) e
devemos aprender a humildade dos seres mais inúteis, que na época eram as
criancinhas (Mt 18,5).
Nessa conversão, ao admitir Deus como Pai e os homens
como superiores, está a base ética do evangelho. É necessário que aceitemos
também a base teológica que é a fé. Por isso Jesus acrescenta: Crede no
evangelho. Isto é, escravos não por temor ou por amor ao lucro, mas porque
estamos convencidos de que o serviço é a melhor maneira de atender ao apelo de
Deus e às necessidades do próximo.
PISTAS: 1) as respostas de Jesus são respostas à pergunta
de muitos judeus sobre o uso do milagre pelo Filho de Deus todo-poderoso. Como
tendo em suas mãos o poder divino só o usou para curar doenças e aplacar fomes
alheias? Por que, sendo Filho de Deus não desceu da cruz e esmagou seus inimigos?
(Mt 27, 40). Como é possível que podendo, com um sinal estupendo, reduzir
oposições e mostrar com total evidência a sua relevância, não o fizesse? (Lc
11, 16). A resposta a estas questões está nas palavras com as quais Jesus
rejeita as tentações. Devemos estudá-las com atenção.
2) Já que também nós, em determinadas circunstâncias, tentamos o Senhor: por
que a mim, por que tenho eu de ser sujeito de determinada desgraça e
infelicidade? Será que tenho que mudar de Senhor ou de Religião?
3) Passando do sujeito individual ao coletivo: por que tantas guerras, por
que tanto mal no mundo? Deus que pode tudo, por que permite que os bons sejam
os mais vulneráveis e os maus os mais seguros e felizes em suas vidas atuais? A
resposta seria, sem dúvida, a que nos deu Jesus: Deus ama também seus inimigos.
4) Uma pergunta óbvia: Os traslados, a presença do Diabo, foram reais ou
foram fatos imaginários? Cremos que a resposta está nos estudos médicos
modernos: o jejum prolongado transforma em realidade o que podemos chamar sonho
ou imaginação.
5) Temos visto que o Reino é o ponto central de Jesus. Teremos que renovar
as nossas ideias sobre o Reino durante esta quaresma. O serviço deve ser a
ideia central de nossa renovação, que nas palavras de Jesus é chamada de
conversão.
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Gn 9,8-15 / Sl 241Pd 3,18-22 / Mc 1,12-15
A leitura do Gênesis nos mostrou como Deus é cheio de bons sentimentos em
relação a nós: depois de haver lavado todo pecado da terra pelo dilúvio,
misericordiosamente, Deus fez aliança com toda a humanidade e com todas as
criaturas: E, de modo poético, o Senhor colocou no céu o seu arco, o arco-íris,
como sinal de paz, de ponte que liga a criatura ao Criador: Com esta imagem a
Escritura Sagrada nos diz que os pensamentos do Senhor são de paz e salvação.
Nosso Senhor, morto na sua natureza humana, isto é, morto na carne, foi
justificado, ressuscitado pelo Pai no Espírito Santo para nos dar a salvação
definitiva, selando conosco a aliança eterna, da qual aquela de Noé era apenas
uma prefiguração. Deus nos salvou em Cristo, dando-nos o seu Espírito Santo,
recebido por nós nas águas do Batismo, que purificam mais que aquelas outras,
do dilúvio! Nunca esqueçamos: fomos lavados, purificados, gerados de novo, no
santo Batismo. Somos membros do povo da aliança nova e eterna, somos uma
humanidade nova, nascida “não da vontade do sangue, nem da vontade da carne,
nem da vontade do homem, mas de Deus” (Jo 1,12). Somos o povo santo resgatado
pelo sangue de Cristo, povo que vive no Espírito Santo que o Ressuscitado
derramou sobre nós.
Uma grande miséria dos cristãos destes tempos nossos é
terem perdido a consciência que somos um povo sagrado, vivendo entre os outros
povos do mundo. A miséria nossa é querermos ser como todo mundo, viver como
todo mundo, pensar e agir como todo mundo. Isso é trair a nossa vocação de povo
sagrado, povo sacerdotal, povo que deve, com a vida e a boca cantar as
maravilhas daquele que nos chamou das trevas para a sua luz admirável! (cf. 2Pd
2,9) Convertamo-nos! Sejamos dignos da nossa vocação!
Somos convidados nestes dias a retomar a consciência de ser este povo santo.
A Quaresma é um tempo de deserto, de provação, de combate espiritual contra
Satanás, o Pai da mentira, o enganador da humanidade. Sem combate não há
vitória e não há vida cristã de verdade! A Igreja, dá-nos as armas para o
combate:
a oração, a penitência e a esmola.
O importante é que ninguém fique indiferente a misericórdia
que o Senhor nos concede!
Quaresma é um tempo onde somos convidados pelo Espírito ao DESERTO para nos
fortalecer nas TENTAÇÕES, que freqüentemente tentam nos afastar dos planos de
Deus.
Diz Santo Agostinho que, ninguém se conhece a si mesmo sem ser
experimentado, e não pode ser coroado sem ter vencido, e não pode vencer, se
não tiver combatido e não pode lutar se não encontrou o inimigo e as tentações.
O demônio promete sempre mais do que pode dar. A felicidade está muito longe
das suas mãos. Toda a tentação é sempre um engano! o demônio conta com as
nossas ambições.. Muitas vezes, o pior dos ídolos é o nosso próprio eu. Temos
que vigiar, em luta constante, porque dentro de nós permanece a tendência de
desejar a glória humana, apesar de termos dito ao Senhor que não queremos outra
glória que não a dele. Jesus também se dirige a nós quando diz: “Adorarás o
Senhor teu Deus e só a Ele servirás”. E é isto o que nós desejamos e pedimos:
servir a Deus alicerçados na vocação a que Ele nos chamou.
O Senhor está sempre ao nosso lado, em cada tentação, e nos diz
afetuosamente: “Confiai: Eu venci o mundo” (Jo16, 33). E com o salmista podemos
dizer: “O Senhor é a minha luz e a minha salvação; a quem temerei?” (Sl 26, 1).
“Procuremos fugir das ocasiões de pecado, por pequenas que sejam, pois
aquele que ama o perigo nele perecerá” (Eclo 3, 27). Como Jesus nos ensinou na
oração do Pai Nosso: “Não nos deixeis cair em tentação”; é necessário repetir
muitas vezes e com confiança essa oração!
Na Quaresma somos todos chamados ao deserto, para um confronto conosco
mesmos, com Deus e com o próximo e os bens materiais. Somos chamados a
despojar-nos de nós mesmos para nos revestir de Deus.
Durante a Quaresma a Igreja, no Brasil, celebra a Campanha da Fraternidade,
com o tema: Fraternidade e Saúde Pública, e o lema: “Que a saúde se difunda
sobre a terra” (Eclo 38,8)! Como discípulos missionários de Jesus Cristo, todos
os cristãos católicos são convocados a promover a vida. Difundir a saúde é
cuidar para que todos tenham vida, e a tenham em plenitude.
O cuidado com a saúde é uma exigência fundamental na vida. Zelar pela saúde
não é apenas combater as doenças mas principalmente evitá-las. A saúde é dom de
Deus, mas é também conquista humana. O zelo pela saúde é responsabilidade de
cada pessoa e dever do Estado. A Igreja, através da Pastoral da Saúde, busca
ser a voz sensibilizadora e denunciadora do descaso de muitas autoridades e
órgãos governamentais onde conta o ter e o poder, onde a saúde é vista como
mercadoria e as pessoas doentes com um peso para o Estado.
Por isso, é nossa missão amar, defender e proteger a vida desde a concepção
até o seu declínio natural.
«
Pregar» sempre indica, no
NT, a pregação da salvação. Esta pregação de Jesus «
aos espíritos que
estavam na prisão» é a referência bíblica mais clara à verdade professada
no
Credo acerca de
«
Se salvaram através da água»: Noé, a mulher, 3 filhos e 3 noras (8
pessoas, sem contar os netos: cf
Gn 6 – 9). Como se vê, a
água
aqui não é tomada no seu aspecto de castigo e destruição, como uma água
mortífera, mas como uma água salvadora, um meio de os sobreviventes se
Fala o Santo Padre
para realizar plenamente a vida na liberdade é necessário superar a prova
que a própria liberdade exige, isto é, a tentação. Só estando livre da
escravidão da mentira e do pecado, a pessoa humana, graças à obediência da fé
que a abre à verdade, encontra o sentido pleno da sua existência e alcança a
paz, o amor e a alegria.
Precisamente por isto a Quaresma constitui um tempo favorável para uma
atenta revisão de vida no recolhimento, na oração e na penitência. (…)
Invocamos a protecção materna da Virgem Maria, para que a Quaresma seja para
todos os cristãos uma ocasião de conversão e de estímulo mais corajoso à
santidade.
Papa Bento XVI,
Angelus, I Domingo de Quaresma, 5 de Março de
2006