Mc
2,23-3,6 9.º
Domingo do Tempo Comum Ano B 2018
A liturgia convida-nos a refletir sobre
a celebração do Dia do Senhor.
LEITURA I – Deut 5,12-15 Leitura do Livro do Deuteronômio.
Assim fala o
Senhor: “Guarda o dia de sábado, para o santificares, como o Senhor teu Deus te
mandou. Trabalharás seis dias e neles farás todas as tuas obras. O sétimo dia é
o do sábado, o dia do descanso dedicado ao Senhor teu Deus. Não farás trabalho
algum, nem tu, nem teu filho, nem tua filha, nem teu escravo, nem tua escrava,
nem teu boi, nem teu jumento, nem algum de teus animais, nem o estrangeiro que
vive em tuas cidades, para que assim teu escravo e tua escrava repousem da
mesma forma que tu. Lembra-te de que foste escravo no Egito e que de lá o
Senhor teu Deus te fez sair com mão forte e braço estendido. É por isso que o
Senhor teu Deus te mandou guardar o sábado”.
AMBIENTE
O livro do Deuteronômio, mesmo que de
redação posterior ao tempo da narração (que seria o tempo do caminho deserto,
sob a guia de Moisés) e com notórias influências de textos extra-bíblicos de
culturas vizinhas do Povo de Israel (nomeadamente dos tratados de vassalagem
neo-assírios), é importante para as reformas de Ezequias (725-697 a.C.; cf. 2Rs
18,4.22) e sobretudo de Josias (640-609 a.C.; cf. 2Rs 23,4-20), uma vez que as
centra no evento fundador de Israel como Povo, com a celebração da Aliança no
Sinai-Horeb. Os elementos fundamentais que dão corpo às reformas são: o
monoteísmo (um só Deus), a centralidade do curso num só lugar (Jerusalém), a Aliança
de Deus-YHWH com o povo, que faz do Povo propriedade de Deus-YHWH e, portanto,
a unidade do povo, demostrando a insensatez da constituição de dois reinos no
período pós-salomónico e afirmando o ideal de regressar à unidade política das
12 tribos de Israel.
O livro do Deuteronômio é tradicionalmente dividido em três grandes secções, que corresponderiam a três grandes discursos de Moisés; o nosso texto situa-se no início do segundo discurso (cf. Dt 4,44 – 26,19), depois de uma breve introdução histórica que o situa no contexto da teofania do Sinai-Horeb (Dt 4,44 – 5,5) e é parte da versão deuteronômica do decálogo (Dt 5,6-21). Quanto à sua forma literária, sendo parte do decálogo (dez mandamentos), é um texto de carácter legislativo, sem perder, porém, a sua componente didática como se vê pelo início do discurso de Moisés.
O livro do Deuteronômio é tradicionalmente dividido em três grandes secções, que corresponderiam a três grandes discursos de Moisés; o nosso texto situa-se no início do segundo discurso (cf. Dt 4,44 – 26,19), depois de uma breve introdução histórica que o situa no contexto da teofania do Sinai-Horeb (Dt 4,44 – 5,5) e é parte da versão deuteronômica do decálogo (Dt 5,6-21). Quanto à sua forma literária, sendo parte do decálogo (dez mandamentos), é um texto de carácter legislativo, sem perder, porém, a sua componente didática como se vê pelo início do discurso de Moisés.
MENSAGEM
Não é difícil perceber qual a temática
que está em foco no texto de Dt 5,12-15: trata-se do mandamento referente ao
sábado, como se percebe até pela repetição desta palavra por três vezes.
Praticamente é a enunciação do mandamento, uma explicação didática de como se
deve praticar esse mandamento e uma fundamentação teológica para essa mesma
prática.
Quanto à enunciação do mandamento, há que notar que, a par do mandamento de honrar pai e mãe (cf. Dt 5,16), este é o único que não exprime uma proibição, mas uma ordem positiva: «Guarda o dia de sábado, para o santificares» (v. 12). Este enunciado positivo desdobra-se depois em duas explicações, uma positiva (v.13-14a) e outra em chave de proibição (v.14b): a positiva basicamente estabelece que o trabalho seja limitado aos primeiros seis dias da semana, de modo a reservar o sábado para o Senhor-YHWH, mostrando que o «sábado» é um dia que lhe pertence; já a explicação em chave de proibição centra-se na celebração do sábado que exclui qualquer possibilidade de trabalho. Esta explicação negativa, porém, transporta consigo um ideal de justiça para a sociedade que se baseia na solidariedade, uma vez que é uma espécie de crítica direta a um sistema social baseado numa lógica de mercado, uma vez que todos, também os escravos e os estrangeiros, são chamados a guardar o dia de sábado, com igualdade de direitos em relação às classes médias-altas que teriam a possibilidade de guardar o sábado exatamente socorrendo-se dos serviços de escravos e estrangeiros. A terceira parte do texto, o fundamento teológico, é típico do Deuteronômio, uma vez que, ao contrário do decálogo do livro do Êxodo que fundamenta o sábado com o repouso de Deus na obra da criação (cf. Ex 20,8-11), o Deuteronômio relaciona a obrigação do sábado com o evento de libertação do Egito (Dt 5,15); de facto, este último livro do Pentateuco insiste fortemente sobre a importância da memória da escravatura de Israel no Egito e sobre a libertação que lhe pôs termo (cf. Dt 4,23; 7,19; 11,2; 26,8).
Uma releitura do texto do decálogo na versão do Deuteronômio (5,6-21) permite notar que o mandamento referente ao sábado é central a vários títulos no contexto do mesmo decálogo e, portanto, de importância cabal para a identidade hebraica: numa divisão tripartida do decálogo deuteronômio (vv. 6-11; vv. 12-15; vv. 16-21), o sábado ocupa a posição central; além disso, no contexto do decálogo menciona-se o evento libertador do Egito por duas vezes, a primeira no título que encabeça todo o decálogo (Dt 5,6) e no mandamento do sábado (Dt 5,15). Centrado assim na experiência libertadora do Êxodo, que é constitutiva para Israel, este mandamento funciona como um símbolo dos deveres para com o Senhor-YHWH, Deus libertador (Dt 5,6.15) e para com o próximo, que também fez a experiência da libertação (Dt 5,14.21).
Quanto à enunciação do mandamento, há que notar que, a par do mandamento de honrar pai e mãe (cf. Dt 5,16), este é o único que não exprime uma proibição, mas uma ordem positiva: «Guarda o dia de sábado, para o santificares» (v. 12). Este enunciado positivo desdobra-se depois em duas explicações, uma positiva (v.13-14a) e outra em chave de proibição (v.14b): a positiva basicamente estabelece que o trabalho seja limitado aos primeiros seis dias da semana, de modo a reservar o sábado para o Senhor-YHWH, mostrando que o «sábado» é um dia que lhe pertence; já a explicação em chave de proibição centra-se na celebração do sábado que exclui qualquer possibilidade de trabalho. Esta explicação negativa, porém, transporta consigo um ideal de justiça para a sociedade que se baseia na solidariedade, uma vez que é uma espécie de crítica direta a um sistema social baseado numa lógica de mercado, uma vez que todos, também os escravos e os estrangeiros, são chamados a guardar o dia de sábado, com igualdade de direitos em relação às classes médias-altas que teriam a possibilidade de guardar o sábado exatamente socorrendo-se dos serviços de escravos e estrangeiros. A terceira parte do texto, o fundamento teológico, é típico do Deuteronômio, uma vez que, ao contrário do decálogo do livro do Êxodo que fundamenta o sábado com o repouso de Deus na obra da criação (cf. Ex 20,8-11), o Deuteronômio relaciona a obrigação do sábado com o evento de libertação do Egito (Dt 5,15); de facto, este último livro do Pentateuco insiste fortemente sobre a importância da memória da escravatura de Israel no Egito e sobre a libertação que lhe pôs termo (cf. Dt 4,23; 7,19; 11,2; 26,8).
Uma releitura do texto do decálogo na versão do Deuteronômio (5,6-21) permite notar que o mandamento referente ao sábado é central a vários títulos no contexto do mesmo decálogo e, portanto, de importância cabal para a identidade hebraica: numa divisão tripartida do decálogo deuteronômio (vv. 6-11; vv. 12-15; vv. 16-21), o sábado ocupa a posição central; além disso, no contexto do decálogo menciona-se o evento libertador do Egito por duas vezes, a primeira no título que encabeça todo o decálogo (Dt 5,6) e no mandamento do sábado (Dt 5,15). Centrado assim na experiência libertadora do Êxodo, que é constitutiva para Israel, este mandamento funciona como um símbolo dos deveres para com o Senhor-YHWH, Deus libertador (Dt 5,6.15) e para com o próximo, que também fez a experiência da libertação (Dt 5,14.21).
ATUALIZAÇÃO
• Uma compreensão anárquica da
realidade poderia relativizar os preceitos do Decálogo do Deuteronômio e, mais
concretamente, de «guardar o dia de sábado para o santificar». Há que ter em
conta que a Lei é sobretudo instrução paternal de Deus, uma oferta para o seu
Povo, para regular as relações em sociedade. O texto da primeira leitura
convida-nos a regressar aos fundamentos da celebração do Dia do Senhor, tomando
a sério o valor do verbo «santificar».
• Destacámos para o sábado e podemos
fazê-lo para o domingo cristão as duas fundamentações teológicas expressas no
livro do Êxodo e do Deuteronômio, respetivamente, fazendo memória do repouso do
Senhor, depois da obra da criação, e da sua obra de libertação da escravidão do
Egito. É importante voltar aos fundamentos da celebração do Dia do Senhor,
vivendo-o como memorial da libertação do Pecado na Páscoa de Cristo que
atualiza a obra libertadora de Deus da escravidão do Egito.
• Notámos que a celebração do Dia do
Senhor - sábado para os judeus e domingo para os cristãos - tem uma grande
dimensão social, sendo dia de descanso para todos, garantindo esse direito
sobretudo aos pobres que se veem assim protegidos pela Lei divina. Como ensina
o Catecismo da Igreja Católica: «O agir de Deus é o modelo do agir humano. Se
Deus “descansou” no sétimo dia, o homem deve também “descansar” e deixar que os
outros, sobretudo os pobres, “tomem fôlego”. O sábado faz cessar os trabalhos
quotidianos e concede uma folga. É um dia de protesto contra as servidões do
trabalho e o culto do dinheiro» (n. 2172).
• O texto do Deuteronômio socorre-se de
uma tradição antiga, que está na origem de Israel como Povo, para redefinir a
própria identidade em tempo de crise, concretamente no tempo do exílio e
pós-exílio. A celebração do Dia do Senhor pode ser um bom recurso para
recuperar a identidade cristã. De facto, se no passado irmãos nossos deram a
vida para defender o domingo («Não podemos passar sem o domingo», diziam diante
do cônsul que os condenaria à morte, como quem diz, «sem nos reunirmos em
assembleia ao domingo para celebrar a Eucaristia não podemos viver»). Como
ensinou Bento XVI, a experiência dos mártires de Abitene pode ser paradigmática
para nós cristãos do séc. XXI: «Precisamos do pão da vida para enfrentar as
fadigas e o cansaço da viagem. O Domingo, Dia do Senhor, é a ocasião propícia
para haurir a força d'Ele, que é o Senhor da vida. Por conseguinte, o preceito
festivo não é um dever imposto pelo exterior, um peso sobre os nossos ombros.
Ao contrário, participar na Celebração dominical, alimentar-se do Pão
eucarístico e experimentar a comunhão dos irmãos e irmãs em Cristo é uma
necessidade para o cristão, é uma alegria, e assim pode encontrar a energia
necessária para o caminho que devemos percorrer todas as semanas. Um caminho,
aliás, não arbitrário: a via que Deus nos indica na sua Palavra vai na direção
inscrita na própria essência do homem, a Palavra de Deus e a razão caminham
juntas. Seguir a Palavra de Deus e caminhar com Cristo significa para o homem
realizar-se a si mesmo; perdê-la equivale a perder-se a si próprio.»
SALMO RESPONSORIAL
/ Sl 80(81)
Exultai no
Senhor, a nossa força!
• Cantai salmos, tocai tamborim, / harpa e lira suaves
tocai! / Na lua nova soai a trombeta, / na lua cheia, na festa solene!
• Porque isso é costume em Jacó, / um preceito do Deus
de Israel; / uma lei que foi dada a José, / quando o povo saiu do Egito.
• Eis que ouço
uma voz que não conheço: / “aliviei as tuas costas de seu fardo, / cestos
pesados eu tirei das tuas mãos. / Na angústia a mim clamaste, e te salvei.
• Em teu meio não exista um deus estranho / nem adores
a um deus desconhecido! / Porque eu sou o teu Deus e teu Senhor, / que da terra
do Egito te arranquei”.
SEGUNDA LEITURA (2Cor
4,6-11) Leitura da Segunda Carta de São Paulo aos Coríntios.
Irmãos, Deus que
disse: “Do meio das trevas brilhe a luz”, é o mesmo que fez brilhar a sua luz
em nossos corações, para tornar claro o conhecimento da sua glória na face de
Cristo. Ora, trazemos esse tesouro em vasos de barro, para que todos reconheçam
que este poder extraordinário vem de Deus e não de nós. Somos afligidos de
todos os lados, mas não vencidos pela angústia; postos entre os maiores apuros,
mas sem perder a esperança; perseguidos, mas não desamparados; derrubados, mas
não aniquilados; por toda a parte e sempre levamos em nós mesmos os sofrimentos
mortais de Jesus, para que também a vida de Jesus seja manifestada em nossos
corpos. De fato, nós, os vivos, somos continuamente entregues à morte, por
causa de Jesus, para que também a vida de Jesus seja manifestada em nossa
natureza mortal.
AMBIENTE
A relação de Paulo com as comunidades
cristãs por ele fundadas ou pelo menos solidificadas é semelhante à de um pai
que se ocupa da educação dos filhos: ao verificar comportamentos pouco
condizentes com a fé cristã, Paulo intervém indicando o caminho a seguir. Esta
atitude não será certamente estranha a quem conhece a Primeira Carta aos
Coríntios, em que o apóstolo das gentes individua vários comportamentos
reprováveis e mostra o caminho a seguir, oferecendo também, normalmente, um
fundamento teológico. A Segunda Carta de São Paulo aos Coríntios insere-se
nestas relações paternas de Paulo com aquela comunidade, que se fazem através
de visitas presenciais e de correspondência epistolar. Uma vez que o seu
ministério apostólico é posto em causa, muito provavelmente pelo grupo dos
“Homens Espirituais” a que se refere a Primeira Carta aos Coríntios (cf.
2,6-16; 4,8-10) e nem sequer os seus cristãos vêm em sua defesa, Paulo faz a
sua apologia, uma espécie de defesa do seu ministério apostólico, mostrando que
nele se verificam os critérios que permitem identificar um verdadeiro apóstolo.
É neste contexto que se insere este texto proposto pela liturgia, que se esforça por demonstrar que o ministério apostólico de Paulo é condizente com o mistério de Cristo e, sobretudo, não o ofusca com pretensões de protagonismo, uma vez que é o conteúdo da mensagem transmitida por Paulo que assume o verdadeiro papel de protagonista na sua missão apostólica.
É neste contexto que se insere este texto proposto pela liturgia, que se esforça por demonstrar que o ministério apostólico de Paulo é condizente com o mistério de Cristo e, sobretudo, não o ofusca com pretensões de protagonismo, uma vez que é o conteúdo da mensagem transmitida por Paulo que assume o verdadeiro papel de protagonista na sua missão apostólica.
MENSAGEM
No centro do nosso texto, temos uma
descrição autobiográfica de situações limite (vv. 8-9) vividas pelo apóstolo
Paulo e possivelmente pelos seus companheiros que, porém, não põem termo à sua
vida, mas que demonstram bem como a vida humana do apóstolo é frágil, não
imortal. Estes factos autobiográficos, conjugados com a imagem simbólica dos
«vasos de barro» – a fragilidade e a limitação humana – que transportam o
«tesouro do ministério» apostólico, ou seja, o Evangelho, enquanto conteúdo da
mensagem que o apóstolo anuncia (v. 7). Há, portanto, uma desproporção de valor
entre os «vasos de barro» e o «tesouro» que eles transportam e isso será
visível no contraste que se estabelece entre as situações de fragilidade
descritas nos vv. 8-9 e a mensagem que essas situações podem transmitir (v.
10), isto é, que a vida e a morte de Cristo estão presentes nas várias
situações existenciais, mesmo nas tribulações do apóstolo. Este é um ponto
assente na teologia e na vivência de fé de Paulo, como se pode verificar ao
comparar 2Cor 4,8-10 com Gl 2,19-20 («Estou crucificado com Cristo. Já não sou
eu que vivo, mas é Cristo que vive em mim»); e ainda na Carta aos Gálatas, o
apóstolo quisera demonstrar que o Evangelho por ele pregado não tinha origem na
vontade humana, mas é fruto da revelação divina (cf. Gl 1,11-12: «O Evangelho
por mim anunciado, não o conheci à maneira humana; pois eu não o recebi nem
aprendi de homem algum, mas por uma revelação de Jesus Cristo»).
Não podemos esquecer que este texto se situa num ambiente apologético, de defesa do apóstolo diante de quem denigre o seu ministério. De facto, a grande mensagem do nosso texto está nas frases de abertura e de conclusão que servem de moldura a esta descrição autobiográfica de Paulo: ele não se anuncia a si mesmo (v. 5), mas anuncia «a glória de Deus, que se reflete no rosto de Cristo» (v. 6), e que Deus, autor da luz na criação do mundo, fez brilhar como luz no seu coração, talvez numa alusão, também autobiográfica, ao episódio da estrada de Damasco, do encontro com Cristo, quando «uma grande luz o envolveu» (At 9,4). O objetivo de Paulo é demonstrar que Cristo está vivo no seu ministério apostólico, mesmo a partir da fragilidade que se manifesta na forma como é perseguido e entregue à morte em nome de Cristo (v. 11).
Não podemos esquecer que este texto se situa num ambiente apologético, de defesa do apóstolo diante de quem denigre o seu ministério. De facto, a grande mensagem do nosso texto está nas frases de abertura e de conclusão que servem de moldura a esta descrição autobiográfica de Paulo: ele não se anuncia a si mesmo (v. 5), mas anuncia «a glória de Deus, que se reflete no rosto de Cristo» (v. 6), e que Deus, autor da luz na criação do mundo, fez brilhar como luz no seu coração, talvez numa alusão, também autobiográfica, ao episódio da estrada de Damasco, do encontro com Cristo, quando «uma grande luz o envolveu» (At 9,4). O objetivo de Paulo é demonstrar que Cristo está vivo no seu ministério apostólico, mesmo a partir da fragilidade que se manifesta na forma como é perseguido e entregue à morte em nome de Cristo (v. 11).
ATUALIZAÇÃO
• São Paulo é um modelo de servidor do
Evangelho para todos os que, na Igreja, se posicionam ao serviço humilde do
Povo de Deus. Dele aprendemos que a grande característica do apostolado, mais
que as ações pastorais inovadoras ou não, é a relação com Cristo, a ponto de
trazer na própria vida as marcas dessa união, seja nas tribulações que se sofre
por causa de Cristo e do Evangelho, seja porque se incarna na própria vida
aquilo que se ensina.
• Para se exercer um serviço na Igreja,
mais concretamente ao serviço do anúncio e da evangelização, sem excluir nenhum
dos outros serviços e ministérios, é necessário pôr de parte todo e qualquer
desejo de ser protagonista, para dar protagonismo ao Evangelho, verdadeiro
«tesouro» que transportamos «em vasos de barro», frágeis, da nossa fragilidade
humana. Mesmo quando o Senhor fortalece a nossa fragilidade, é importante que
seja claro para nós, como era para Paulo, que o verdadeiro tesouro é o
Evangelho que não depende de nós, mas de Deus que no-lo deu a conhecer na
pessoa de Jesus Cristo.
• A vida do evangelizador deve
conformar-se cada vez mais à vida de Cristo a ponto de se tornar um espelho de
Cristo, um livro aberto do Evangelho, onde se pode ler os sinais da vida
oferecida de Jesus. Só uma grande intimidade com Jesus Cristo, como a que teve
Paulo, poderá dar-nos a possibilidade de sermos pessoas identificadas com o
Evangelho que anunciamos.
EVANGELHO (Mc
2,23-3,6 – forma mais longa) Evangelho de
Jesus Cristo segundo Marcos.
Jesus estava
passando por uns campos de trigo, em dia de sábado. Seus discípulos começaram a
arrancar espigas, enquanto caminhavam. Então os fariseus disseram a Jesus:
“Olha! Por que eles fazem em dia de sábado o que não é permitido?” Jesus lhes
disse: “Por acaso, nunca lestes o que Davi e seus companheiros fizeram quando
passaram necessidade e tiveram fome? Como ele entrou na casa de Deus, no tempo
em que Abiatar era sumo sacerdote, comeu os pães oferecidos a Deus, e os deu
também aos seus companheiros? No entanto, só aos sacerdotes é permitido comer
esses pães”. E acrescentou: “O sábado foi feito para o homem, e não o homem para
o sábado. Portanto, o Filho do Homem é senhor também do sábado”. Jesus entrou
de novo na sinagoga. Havia ali um homem com a mão seca. Alguns o observavam para ver se haveria de
curar em dia de sábado, para poderem acusá-lo. Jesus disse ao homem da mão seca:
“Levanta-te e fica aqui no meio!” E perguntou-lhes: “É permitido no sábado
fazer o bem ou fazer o mal? Salvar uma vida ou deixá-la morrer?” Mas eles nada
disseram. Jesus, então, olhou ao seu redor, cheio de ira e tristeza, porque
eram duros de coração; e disse ao homem: “Estende a mão”. Ele a estendeu e a
mão ficou curada. Ao saírem, os fariseus com os partidários de Herodes
imediatamente tramaram, contra Jesus, a maneira como haveriam de matá-lo.
AMBIENTE
O texto evangélico deste domingo
conclui a primeira secção do Evangelho de Marcos, que descreve a fase inicial
do ministério de Jesus (cf. 1,14-3,6), e é a última das controvérsias de Jesus
com os seus opositores acerca de algumas práticas rituais judaicas, no caso
sobre o sábado judaico. É de notar que estes dois textos que formam Mc 1,23 –
3,6 são os únicos dois textos de Marcos em que Jesus se contrapõe ao sábado; no
resto do Evangelho, tanto Jesus como quem está com Ele observam as práticas
judaicas a respeito do mandamento de guardar o sábado. Recapitulando, Jesus
tinha-se já confrontado com os escribas a respeito do perdão dos pecados ao
paralítico (cf. 2,1-13), do estar à mesa com os publicamos e pecadores (cf.
2,14-17); depois, com os discípulos de João Batista e os fariseus sobre as
práticas do jejum, não observado pelos discípulos de Jesus (cf. 2,18-22);
confronta-se agora com os fariseus sobre o respeito pelo dia de sábado em dois
episódios (2,23-28; 3,1-6), sendo que, neste último episódio, pela primeira vez
os seus opositores se reuniam com os herodianos para encontrar maneira de
condenar Jesus à morte (3,6), funcionando esta decisão como conclusão de todos
os confrontos.
Será bom ter em conta o objetivo desta primeira secção do Evangelho de Marcos; o evangelista pretende mostrar a novidade trazida pelo movimento de Jesus, bem diferente do ambiente judaico e rabínico, mostrando o amor de Deus pelos que estavam marginalizados (os publicamos e pecadores), uma mensagem que toma corpo no perdão dos pecados (na cura do paralítico) e a total rejeição de leituras rigoristas da Lei de Moisés, demonstrando que o formalismo pode aniquilar a experiência de fé, que deve estar sempre orientada para o bem do outro. Como se verá o critério que Jesus deixa para interpretar o sábado judaico, mas também outros preceitos é o amor ao outro.
Será bom ter em conta o objetivo desta primeira secção do Evangelho de Marcos; o evangelista pretende mostrar a novidade trazida pelo movimento de Jesus, bem diferente do ambiente judaico e rabínico, mostrando o amor de Deus pelos que estavam marginalizados (os publicamos e pecadores), uma mensagem que toma corpo no perdão dos pecados (na cura do paralítico) e a total rejeição de leituras rigoristas da Lei de Moisés, demonstrando que o formalismo pode aniquilar a experiência de fé, que deve estar sempre orientada para o bem do outro. Como se verá o critério que Jesus deixa para interpretar o sábado judaico, mas também outros preceitos é o amor ao outro.
MENSAGEM
O nosso texto é composto por dois
episódios que colocam Jesus em confronto com a instituição do sábado judaico:
os discípulos a colher espigas para comer e um homem com uma mão atrofiada que
nos coloca, com Jesus e os seus interlocutores, diante do dilema de curar ou
não esse homem; ambos os episódios em dia de sábado. No que ao primeiro
episódio diz respeito, o problema de colher espigas talvez seja o problema de
se entender como colheita.
De qualquer forma, Marcos convida-nos a centrar-nos nas palavras de Jesus que ajudam a interpretar a sua liberdade diante da instituição do sábado judaico: «O sábado foi feito para o homem e não o homem para o sábado. Por isso, o Filho do homem é também Senhor do sábado» (Mc 2,27-28); «Será permitido ao sábado fazer bem ou fazer mal, salvar a vida ou tirá-la?» (Mc 3,4). Estas palavras de Jesus dão a interpretação dos episódios, bem como da forma como Jesus se posiciona diante da instituição de sábado em geral.
Já na controvérsia de Mc 2,1-12 sobre o perdão dos pecados, a questão era do «poder» ou «autoridade» para o fazer. Da mesma forma, agora apenas nas palavras de Jesus, a relação de Jesus com o sábado exprime-se em chave de poder e autoridade, uma vez que Ele, «o Filho do homem, é também Senhor do sábado» (Mc 2,28).
A segunda linha de argumentação é a da total precedência das necessidades humanas, mesmo em relação ao sagrado: isto vale para a fome dos discípulos diante do sábado que é sagrado, como valeu para a fome de David e dos seus homens diante dos pães sagrados da proposição (pelo menos na forma como Mc 2,25-26 nos conta o episódio com algumas nuances em relação a 1Sm 21,1-7) e valerá também para a cura do homem com a mão atrofiada diante da instituição de sábado. Diante do poder de Jesus e das necessidades humanas, as coisas sagradas não têm um valor próprio (nem o pão do santuário, no caso de David, nem o sábado, no caso dos discípulos de Jesus ou do homem com a mão atrofiada), mas existem para o bem da humanidade (os pães da proposição para alimentar David e os seus homens, o sábado para o homem e para Jesus); na interpretação de Jesus, é fundamental que o que é sagrado esteja ao serviço do homem. A par deste critério, se partirmos da formulação da pergunta retórica de Mc 3,4, na perspectiva de Jesus não há um agir neutro e ainda menos decisivas são as instituições: a lei é a da atenção ao outro, a quem sou chamado a fazer bem, salvando-lhe a vida, ou então posiciono-me diante dele para lhe fazer mal, causando-lhe a morte. Em ambos os momentos, Jesus escolheu fazer o bem e colocar-se ao serviço das necessidades humanas, satisfazendo-as, mesmo se isso lhe acarreta a decisão do conluio das autoridades políticas e religiosas contra Ele, para o condenarem à morte.
É importante ter em conta que Jesus não retira qualquer importância ao sábado, enquanto dia consagrado a Deus, mas redireciona-o de modo a voltar à intuição inicial da Lei de Moisés, uma vez que «o sábado foi feito para o homem e não o homem para o sábado» (2,27). Não está em causa uma interpretação libertina ou relativista do sábado, mas fazer dele o dia da relação com Deus que vem em auxílio de quem está em necessidade. Uma boa interpretação lê todos estes aforismos de Jesus em relação entre eles, de modo que o sábado esteja sempre ao serviço do homem, para fazer bem e salvar a vida; se, de facto, Jesus é o senhor do sábado, é para o recolocar ao serviço do homem e da salvação da vida.
De qualquer forma, Marcos convida-nos a centrar-nos nas palavras de Jesus que ajudam a interpretar a sua liberdade diante da instituição do sábado judaico: «O sábado foi feito para o homem e não o homem para o sábado. Por isso, o Filho do homem é também Senhor do sábado» (Mc 2,27-28); «Será permitido ao sábado fazer bem ou fazer mal, salvar a vida ou tirá-la?» (Mc 3,4). Estas palavras de Jesus dão a interpretação dos episódios, bem como da forma como Jesus se posiciona diante da instituição de sábado em geral.
Já na controvérsia de Mc 2,1-12 sobre o perdão dos pecados, a questão era do «poder» ou «autoridade» para o fazer. Da mesma forma, agora apenas nas palavras de Jesus, a relação de Jesus com o sábado exprime-se em chave de poder e autoridade, uma vez que Ele, «o Filho do homem, é também Senhor do sábado» (Mc 2,28).
A segunda linha de argumentação é a da total precedência das necessidades humanas, mesmo em relação ao sagrado: isto vale para a fome dos discípulos diante do sábado que é sagrado, como valeu para a fome de David e dos seus homens diante dos pães sagrados da proposição (pelo menos na forma como Mc 2,25-26 nos conta o episódio com algumas nuances em relação a 1Sm 21,1-7) e valerá também para a cura do homem com a mão atrofiada diante da instituição de sábado. Diante do poder de Jesus e das necessidades humanas, as coisas sagradas não têm um valor próprio (nem o pão do santuário, no caso de David, nem o sábado, no caso dos discípulos de Jesus ou do homem com a mão atrofiada), mas existem para o bem da humanidade (os pães da proposição para alimentar David e os seus homens, o sábado para o homem e para Jesus); na interpretação de Jesus, é fundamental que o que é sagrado esteja ao serviço do homem. A par deste critério, se partirmos da formulação da pergunta retórica de Mc 3,4, na perspectiva de Jesus não há um agir neutro e ainda menos decisivas são as instituições: a lei é a da atenção ao outro, a quem sou chamado a fazer bem, salvando-lhe a vida, ou então posiciono-me diante dele para lhe fazer mal, causando-lhe a morte. Em ambos os momentos, Jesus escolheu fazer o bem e colocar-se ao serviço das necessidades humanas, satisfazendo-as, mesmo se isso lhe acarreta a decisão do conluio das autoridades políticas e religiosas contra Ele, para o condenarem à morte.
É importante ter em conta que Jesus não retira qualquer importância ao sábado, enquanto dia consagrado a Deus, mas redireciona-o de modo a voltar à intuição inicial da Lei de Moisés, uma vez que «o sábado foi feito para o homem e não o homem para o sábado» (2,27). Não está em causa uma interpretação libertina ou relativista do sábado, mas fazer dele o dia da relação com Deus que vem em auxílio de quem está em necessidade. Uma boa interpretação lê todos estes aforismos de Jesus em relação entre eles, de modo que o sábado esteja sempre ao serviço do homem, para fazer bem e salvar a vida; se, de facto, Jesus é o senhor do sábado, é para o recolocar ao serviço do homem e da salvação da vida.
ATUALIZAÇÃO
• Jesus ensina-nos a posicionar-nos com
verdadeira liberdade diante da Lei de Moisés, ou melhor, diante da Lei de Deus,
que nos chegou por Moisés, sem perder nunca de vista o seu objetivo de regular
a nossa vida em sociedade e em Igreja, protegendo os mais frágeis e evitando
toda e qualquer opressão por parte de quem exerce o poder. Interpretações
rigoristas da Lei – como são as dos fariseus no nosso texto – cegam e não
deixam ver as necessidades humanas que, na perspectiva de Jesus, são o
verdadeiro critério para manter uma atitude livre diante da Lei.
• O nosso texto não coloca em causa a
celebração do culto no dia de sábado, mas reposiciona-a de modo a que possa
coabitar com o serviço dos necessitados, na pessoa dos discípulos com fome e de
uma pessoa com uma mão atrofiada. A celebração do Dia do Senhor, ao domingo,
pode ser cada vez mais expressão desta dupla faceta do sábado reinterpretado
com Jesus que, em dia de sábado entra na sinagoga, lugar onde se realiza o
culto, mas não pactua com a necessidade de quem sofre, indo em seu auxílio,
dando conforto e, no caso, mesmo a cura. Se o cristão prolonga na existência a
vida de Cristo, é importante que no dia maior, a Ele consagrado, não se perca
de vista aqueles que foram os seus prediletos.
• A regra hermenêutica que Jesus dá
para saber o que se pode fazer ou não ao domingo pode ser transposta para
outros campos da nossa vida: é importante saber que queremos estar ao serviço
do bem e da salvação da vida humana, em linha com o desejo de Deus, tal como se
manifesta na vida e mensagem de Jesus; a par disso, sabemos que as
instituições, sejam elas religiosas ou civis, devem estar ao serviço da vida
humana, para que possam realizar a missão para a qual nasceram.
Nenhum comentário:
Postar um comentário